Discos eternos – Led Zeppelin IV (1971)

Capa-Led-Zeppelin-IV

RIO DE JANEIRO – Após algumas semanas ausentes, os “Discos Eternos” do blog voltam com mais um álbum fundamental da história da música: Led Zeppelin IV, também conhecido informalmente por Zoso, Four Symbols, Disco Sem Nome ou o Disco do Fazendeiro – até porque não havia explicitamente nada que remetesse ao Led na capa ou na contracapa – exceto no som forte, potente, poderoso, marca registrada da banda.

O disco é um divisor de águas entre o hard rock e o heavy metal. Na verdade, é uma fusão dos dois estilos, mesclando também folk music, uma pitadinha de pop, blues de raiz e psicodelia, num trabalho homogêneo como poucos gravados nos idos de 1971.

As duas primeiras músicas são grandes clássicos do Zep até hoje, com os vigorosos riffs de guitarra de Jimmy Page, o baixo marcadinho de John Paul Jones, os falsetes de Robert Plant e as pancadas de Bonzo na bateria. “Black Dog” e “Rock And Roll” são feitas para se ouvir no volume máximo – um contraponto tremendo com as músicas mais, digamos, cabeça, como “Going To California”, “Misty Mountain Hop” e especialmente “Stairway To Heaven”, a música que tanto Page quanto Plant renegaram nos anos que se seguiram ao fim do grupo – inclusive negando-se a tocá-la no último festival Hollywood Rock realizado em 1996, quando os dois vieram ao país na esteira do lançamento do disco Un-Led-Ed gravado pelos dois com farta percussão indiana.

O disco ainda tem excelentes músicas, feito “The Battle of Evermore”, relembrada no filme Singles (Vida de solteiro) pelo grupo Lovemongers, formado pelas integrantes do Heart, Ann e Nancy Wilson, fãs devotadas do Zeppelin. E também “When The Levee Breaks”, graças à intensa marcação de percussão de John Bonham, as linhas de guitarra de Jimmy Page e o vocal gritado de Robert Plant.

O Led estava pronto para deixar os estúdios e se tornar uma grande banda de “arena”, enchendo teatros e estádios grandiosos, arrastando multidões de fãs no mundo inteiro e impondo sua massa sonora de esporro nos palcos mundo afora. O rock and roll ainda não tinha sido tomado de assalto pela fúria do punk e o início dos anos 70 ainda vivia o fim do movimento hippie e os protestos dos pacifistas pelo fim da guerra do Vietnã. E o Zeppelin ainda voaria alto por muito tempo…

Ficha técnica de Led Zeppelin IV 
Selo: Atlantic/Warner Music
Gravado entre dezembro de 1970 e março de 1971, em Londres, Califórnia, Hampshire e no Rolling Stones Mobile Studio
Produzido por Jimmy Page
Tempo total: 42’38″

Músicas:

1. Black Dog (Jones/Page/Plant)
2. Rock And Roll (Bonham/Jones/Page/Plant)
3. The Battle of Evermore (Page/Plant)
4. Stairway to Heaven (Page/Plant)
5. Misty Mountain Hop (Jones/Page/Plant)
6. Four Sticks (Page/Plant)
7. Going to California (Page/Plant)
8. When the Levee Breaks (Memphis Minnie/Bonham/Jones/Page/Plant)

Discos eternos – New Wave Mamão Com Açúcar (1985)

New Wave Mamão com Açucar (1985)RIO DE JANEIRO – Longe vão os tempos de quem, como eu, já passou dos 40 e nos anos oitenta pôde aproveitar bem a juventude. No início daquela década, o rock explodia no Brasil em bom português e, claro, com os grupos internacionais graças ao Rock in Rio. Mas uma outra vertente fazia barulho e ganhava as pistas, ou melhor, as danceterias – que roubavam a vez das decadentes discothèques.

Era o movimento New Wave, a nova onda da música, uma mistureba de glam, punk, pop, eletro e o que mais desse na telha. Músicas dançantes, pra cima, alegres. E foi com esse conceito que nasceu a coletânea New Wave Mamão Com Açúcar, alusiva à danceteria carioca que por um bom tempo foi concorrente de casas como a Help (quando ainda não tinha se transformado em ponto de encontro de mulheres de vida fácil), a Babilônia, a Zoom, a Mamute, entre outras, frequentadas pela garotadinha com cabelo cheio de glitter, roupas da Company, Cantão ou de qualquer outra grife da época, preferencialmente em tons cítricos, tênis quadriculados ou All-Star e relógios Champion, daqueles de pulseiras multicoloridas.

A seleção de repertório foi caprichada e com a mixagem final, bastava deixar o disco rolar que qualquer festinha estava garantida na animação. Lá em Ramos, onde passei a adolescência, o disco rolava direto. Era impressionante. Bastava tocar a primeira faixa e todo mundo começava a pulação.

Também pudera. O disco abre com “Middle Of The Road”, um dos clássicos dos Pretenders, cheio de solos de guitarras e gaitas da banda de Chrissie Hynde, emendando com a enérgica e até hoje sensacional “Dancin’ With Myself”, com Billy Idol e seu grupo Generation X, apelidado de Gen X na capa.

Não para por aí… a loucura continuava com “Private Idaho”, dos alucinados B-52’s, desaguando em “Let’s Go Crazy”, do baixinho invocado Prince e seu grupo The Revolution e nos criativos rapazes do Devo, que mandavam bem em “Beautiful World”.

O lado B abria com dois petardos. “Wake Me Up Before You Go-Go”, aquela do clipe tremendamente gay do Wham!, grupo em que George Michael catapultou-se para o estrelato. Não menos seguidora dessa vertente, “Just Can’t Get Enough”, dos caras do Depeche Mode, era outro hit arrasa-quarteirão, graças aos teclados de Vince Clarke – que depois iria para o Erasure.

Com riffs de guitarras, Huey Lewis & The News estavam representados com “I Want a New Drug”, seguida pela ótima “Dance Hall Days”, do Wang Chung. Como nem tudo é perfeito, a pior faixa era a última – “Native Love (Step by Step)”, do Divine, grupo do produtor Bobby O onde o vocal principal era de um travesti.

Aliás, não só a última música não é das melhores, como a capa do disco (arte de Jejo Cornelsen e Hildebrando de Castro) é uma mensagem subliminar de dois mamões sendo lambidos como se fossem seios. Não pegou bem.

Faltou muita coisa boa nessa coletânea, provavelmente pela questão da cessão dos fonogramas e principalmente pela falta de espaço de um disco de vinil, no qual couberam cinco músicas em cada lado.

Fica a pergunta: se New Wave Mamão Com Açúcar pudesse ganhar uma reedição em CD, quase 30 anos depois, que grupos e/ou artistas vocês colocariam? E com que músicas?

Cartas para a redação.

Ficha Técnica de New Wave Mamão Com Açúcar
Selo: Som Livre
Seleção musical: DJ Cláudio
Supervisão: Sérgio Mota
Lançado em 1985

Músicas:

1. Middle Of The Road (Pretenders)
2. Dancin’ With Myself (Billy Idol and Generation X)
3. Private Idaho (B-52’s)
4. Let’s Go Crazy (Prince & The Revolution)
5. Beautiful World (Devo)
6. Wake Me Up Before You Go-Go (Wham!)
7. Just Can’t Get Enough (Depeche Mode)
8. I Want a New Drug (Huey Lewis & The News)
9. Dance Hall Days (Wang Chung)
10. Native Love [Step by Step] (Divine)

Discos eternos – Tim Maia (1970)

Capa Tim Maia 1970

RIO DE JANEIRO – Enquanto nos anos 60, a Jovem Guarda dava seus últimos suspiros e Roberto Carlos partia célere para assumir o posto de artista mais popular do país, um mulato gordinho, que passou parte da adolescência nos EUA tentava a sorte na música cantando em inglês. E principalmente, investindo num gênero que ainda não tinha espaço por aqui: a Soul Music.

O mulato gordinho em questão era Tim Maia, nascido e criado na Tijuca, amigo de Erasmo Carlos, com quem trocava cartas entusiasmadas quando esteve fora do país. Um assinava “Tim Jobim” e o outro devolvia como “Erasmo Gilberto”. Mas enquanto Erasmo virava o Tremendão e amigo-de-fé-irmão-camarada de Roberto, Tim passava o pão que o diabo amassou. Foi preso, deportado e passou fome e frio em São Paulo até conseguir a indicação de Roberto para gravar na CBS.

Sob a produção do exigente Evandro Ribeiro, Tim não conseguiu fazer suas músicas saírem como queria. Brigou com geral na gravadora e virou persona non grata. Na RGE, para onde iria por intermédio de Erasmo, tentar fazer um compacto e depois o primeiro – e sonhado – disco, aconteceu a mesma coisa e Tim, sabendo que sua hora tinha chegado na música brasileira, ficava para trás.

Foi aí que a sorte lhe sorriu: uma fita levada por Jairo Pires, que o conheceu na CBS como técnico de gravação e que estreava na Philips como produtor, estourou como uma bomba numa das reuniões mensais. Nela estava gravada a sensacional “Primavera”, de Sílvio Rochael e Cassiano. Naqueles idos anos, nada parecido se ouvira por aqui.

Quando o inverno chegar… eu quero estar junto a ti… pode o outono voltar… eu quero estar junto a ti… porque… é primavera… te amo… é primavera… te amo… meu amor…

Nelson Motta, que ouviu a fita entusiasmado, sentiu “cheiro de gol” e pediu que Tim aparecesse na Philips. Ele foi, e mostrou outras músicas. Uma delas, a bossa-nova “These Are The Songs”, saiu em compacto com Elis Regina e Tim, aprovadíssimo pelos Mutantes (que os conheciam do programa Quadrado & Redondo, apresentado por Débora Duarte e Sérgio Galvão na Bandeirantes) e também por Erasmo Carlos, que saía da RGE nessa mesma época e mudava para a gravadora dirigida por André Midani, foi contratado para fazer seu primeiro disco.

Movido a combustíveis alternativos, Tim varou noites no Estúdio Scatena em São Paulo, junto com Jairo Pires e Arnaldo Saccomani, para conseguir que os músicos fizessem o som que queria, e que os maestros Waltel Branco, Waldyr Arouca Barros e Cláudio Roditi transcrevessem os arranjos que o cantor lhes passavam “de boca”.

Com o auxílio luxuoso do conjunto vocal Os Diagonais (que tinha Cassiano, guitarrista-base das gravações, além de Camarão, Marcos e Fernando) e de músicos como o lendário baixista Capacete, Paulinho Batera, Zé Carlos, Guilherme, Garoto e Carlinhos, Tim foi o responsável por um dos maiores petardos musicais do país nos anos 70.

O disco abre com “Coroné Antônio Bento”, uma brincadeira de Camarão, um dos vocalistas dos Diagonais, que caiu no gosto de Tim imediatamente. Nascia uma fórmula que o cantor exploraria nos seus primeiros trabalhos: o baião-soul.

“Cristina”, escrita em parceria com Carlos Imperial, teria sido uma homenagem a uma bela morena chamada… Cristina e que, segundo a lenda, tinha um bumbum descomunal, que enlouquecia o cantor. ‘Vou ver Cristina…’, cantarolava com cara safada, seguindo o rebolado de sua musa. Mas há quem diga, como o biógrafo de Imperial, Denílson Monteiro, que ‘Vou ver Cristina…’ era uma senha para sair do apartamento do compositor e ‘apertar um baseado’. Imperial era avesso a tóxicos e Tim Maia não dispensava um bauretezinho.

O funk “Jurema”, a terceira faixa, é uma menção à famosa entidade Cabocla Jurema, saudada como Joo-rey-mah Queen of The Jungle. Curtinha, mas muito bacana – tanto quanto “Padre Cícero”, uma das melhores do disco e cuja métrica Tim aproveitou para transformar a canção em “João Coragem”, tema do personagem homônimo da novela Irmãos Coragem, grande sucesso da televisão brasileira naquele ano.

Tim ainda gravou uma bonita canção de Natal – “Risos” (de Fábio e Paulo Imperial), “Eu Amo Você”, outra lindíssima composição de Cassiano e Sílvio Rochael, além da belíssima balada “Azul da Cor do Mar”, que teve como inspiração as inúmeras desilusões que o cantor, auto-intitulado preto, gordo e cafajeste, sofria com as meninas que iam para o apartamento onde morava, na Rua Real Grandeza, 171, em Botafogo, para ficar com o cantor Fábio e seu empresário, Glauco.

Com raiva e sentimento, Tim ligava o gravador e, acompanhado do violão, mandava ver.

Ah… se o mundo inteiro me pudesse ouvir… tenho tanto pra contar… dizer que aprendi… que na vida a gente tem que entender… que um nasce pra sofrer… enquanto o outro ri… mas quem sofre sempre tem que procurar… pelo menos vir achar… razão para viver… ter na vida um motivo pra sonhar… ter um sonho todo azul… azul da cor do mar…

Nascia assim o mestre da “cornitude” e Tim Maia começava, com este primeiro e fantástico disco, sua trajetória polêmica e ao mesmo tempo brilhante dentro do cenário musical brasileiro.

Ficha Técnica de Tim Maia
Selo: Polydor/Universal Music
Produção: Jairo Pires e Arnaldo Saccomani
Gravado nos Estúdios Scatena, em São Paulo, e no Cineac-Trianon, no Rio de Janeiro, em 1970
Tempo total de produção: 40’55″

Músicas:

1. Coroné Antônio Bento (Luiz Wanderley/João do Vale)
2. Cristina (Tim Maia/Carlos Imperial)
3. Jurema (Tim Maia)
4. Padre Cícero (Cassiano/Tim Maia)
5. Flamengo (Tim Maia)
6. Você Fingiu (Cassiano)
7. Eu Amo Você (Sílvio Rochael/Cassiano)
8. Primavera (Vai Chuva) (Sílvio Rochael/Cassiano)
9. Risos (Fábio/Paulo Imperial)
10. Azul da Cor do Mar (Tim Maia)
11. Cristina nº 2 (Carlos Imperial/Tim Maia)
12. Tributo a Booker Pittman (Cláudio Roditi)

Discos eternos – Layla and other assorted love songs (1970)

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RIO DE JANEIRO – Este é um disco que permanece eterno na história do rock and roll. E pelo visto, continuará sendo por todo o sempre. Não é para menos: foi uma obra concebida com grande dose de paixão – a mola-mestra do blues, desde os primórdios.

A paixão (fulminante, aliás) em questão era de Eric Clapton, por ninguém menos que Patti Boyd, a esposa do parceiro em “Badge” e amigo desde os tempos dos Beatles, George Harrison. E o guitarrista britânico, que vinha do tumultuado fim do Cream e de excursões com Delaney, Bonnie & Friends, buscou neste álbum canalizar a frustração de um amor não-correspondido .

Durante sua passagem como convidado de Delaney e Bonnie Bramlett, Clapton conheceu os músicos Carl Radle (baixo), Bobby Whitlock (teclados e piano) e Jim Gordon (bateria), convidando-os imediatamente a se juntarem a ele para a formação do Derek And The Dominos. As jam sessions nos lendários estúdios Criteria, em Miami, corriam às mil maravilhas, as composições brotavam e tudo fazia crer que surgia no horizonte um belo disco.

Foi aí que Clapton teve uma sacada genial: chamou Duane Allman, dos Allman Brothers, para encorpar o trabalho e dar às músicas a pegada que ele queria, especialmente em alguns solos. E, sem dúvida, deu resultado: afinal, basta lembrar do riff incial de “Layla”, a canção-homenagem de Clapton e Jim Gordon à Patti Boyd, que é uma belíssima resposta por si só.

Mas o disco, com 14 faixas no total, não se resume apenas e tão-somente à 13ª música, que é “Layla”. Há grandes clássicos do blues, feito “Key To The Highway”, de Charlie Segar e Big Bill Broonzy, além de “Have You Ever Loved A Woman”, esta de Billy Myers, e “It’s Too Late”, composição de Chuck Willis.

Entre novidades de Clapton, como a chorosa “Bell Bottom Blues”, as belíssimas “Anyday” e “Keep On Growing”, o talento dele e de Duane Allman fica evidenciado nos blues de levada mais pesada, como “Nobody Knows You When You’re Down And Out”, “Tell The Truth” e “Why Does Love Got To Be So Sad?”. Mas não é só isso: eles fazem uma excepcional versão de “Little Wing”, uma homenagem e tanto a Jimi Hendrix, que morreria oito dias depois do término das sessões de gravação de Layla And Other Assorted Love Songs.

Ao mesmo tempo em que não conseguia vivenciar aquela que era sua grande paixão (pelo menos naquela época, pois depois ele se casaria com Patti Boyd), Clapton enfrentava pela primeira vez grandes problemas com drogas, mergulhando pesado no vício da heroína. Para piorar, no início da turnê que se seguiu à gravação do disco, Duane Allman morreu num acidente de motocicleta e a carreira de EC entrou em parafuso.

Apesar de tantos obstáculos, o álbum é uma pérola do blues e do rock and roll contemporâneo. Um trabalho tão bom que até o mal-humorado Tom Dowd, que co-produziu o álbum com os Dominos, qualificou Layla… como o melhor disco que fizera desde The Genius of Ray Charles, gravado 10 anos antes.

A maravilhosa capa de Layla… é uma pintura de Emile Theodore Frandsen de Schönberg, intitulada “La Fille de Bouquet” e sem dúvida é uma das mais marcantes de todos os tempos.

Em 2010, o álbum ganhou uma roupagem luxuosa, condizente com o 40º aniversário de lançamento desta obra-prima, com músicas gravadas pelos Dominos como “Roll It Over”, que saíram apenas em single, e com a lendária apresentação do grupo ao vivo no programa de Johnny Cash em novembro de 1970, com direito à participação especial do próprio Cash e da lenda Carl Perkins em “Matchbox Blues”, de autoria deste último.

Ficha Técnica de Layla And Other Assorted Love Songs
Selo: ATCO/Universal Music
Produzido por Tom Dowd e Derek And The Dominos
Gravado nos estúdios Criteria, em Miami (EUA), entre agosto e setembro de 1970
Tempo total: 76’43″

Músicas:

1. I Looked Away (Eric Clapton/Bobby Whitlock)
2. Bell Bottom Blues (Eric Clapton)
3. Keep On Growing (Eric Clapton/Bobby Whitlock)
4. Nobody Knows You When You’re Down And Out (Eric Clapton/Bobby Whitlock0
5. I Am Yours (Eric Clapton/Nizami)
6. Anyday (Eric Clapton/Bobby Whitlock)
7. Key To The Highway (Charlie Segar/Big Bill Broonzy)
8. Tell The Truth (Eric Clapton/Bobby Whitlock)
9. Why Does Love Got To Be So Sad? (Eric Clapton/Bobby Whitlock)
10. Have You Ever Loved A Woman (Billy Myers)
11. Little Wing (Jimi Hendrix)
12. It’s Too Late (Chuck Willis)
13. Layla (Eric Clapton/Jim Gordon)
14. Thorn Tree In The Garden (Bobby Whitlock)

Discos eternos – Os afro-sambas (1966)

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RIO DE JANEIRO – Quando Vinícius de Moraes se autointitulava “o branco mais negro do Brasil”, era bem difícil duvidar das palavras do poetinha.

Mas a negritude do Vina só viria à tona quando foi presenteado por Carlos Coqueijo, compositor bissexto e juiz do Tribunal Regional do Trabalho da Bahia com um disco contendo sambas de roda, pontos de candomblé e toques de berimbau que o encantaram de modo que ele não só passou a se intitular enfaticamente um filho de Oxalá e na linha direta de Xangô como, anos depois, se casaria com a baiana Gessy Gesse e fixaria residência naquele estado.

Voltando algum tempo antes de 1965, Vinícius, desejoso de transformar aquela inspiração toda em música, chamou Baden Powell para compor com ele. Os dois se trancaram no apartamento do poetinha no Parque Guinle, em Laranjeiras e, após beberem caixas e mais caixas de uísque Haig, saíram de lá com 25 canções prontas – oito delas dariam forma ao que seria o disco Os afro-sambas, gravado em 1966 e distribuído pelo selo Forma, de Roberto Quartin.

A produção é um espetáculo. As canções não se limitam ao básico de voz e violão em matéria de arranjos, trazendo instrumentos percussivos como atabaques, bongôs, afoxés, agogôs e pandeiros. O maestro Guerra Peixe foi o responsável pelos arranjos e pela regência nas gravações, que contaram ainda com a luxuosa participação do grupo vocal feminino Quarteto em Cy – que, por sinal, continua existindo até hoje.

Os afro-sambas produziu um clássico instantâneo da MPB, “Canto de Ossanha”, de múltiplas regravações ao longo de quase 50 anos. Havia também os cantos de Xangô, Iemanjá e do Caboclo da Pedra-Preta, pontuando o disco, que tem também as maravilhosas “Tristeza e solidão” e “Tempo de amor”, esta última uma das mais bonitas canções da parceria Vinícius-Baden, que ainda nos ofertaria canções como “Samba em Prelúdio”, “Berimbau” e tantas outras que fizeram a delícia dos ouvintes e história na música popular brasileira.

Ficha técnica de Os afro-sambas
Selo: Forma/Companhia Brasileira de Discos
Gravado em 1966
Produzido por Roberto Quartin e Wadi Gebara
Tempo: 32’42”

Músicas:

1. Canto de Ossanha
2. Canto de Xangô
3. Bocoché
4. Canto de Iemanjá
5. Tempo de amor
6. Canto do Caboclo da Pedra-Preta
7. Tristeza e solidão
8. Lamento de Exu

Discos eternos – Titanomaquia (1993)

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RIO DE JANEIRO – Na mitologia grega, Titanomaquia foi a guerra entre os Titãs, liderados por Cronos e os Deuses Olímpicos, liderados por Zeus, que definiria o destino do Universo. Zeus derrotou Cronos depois de uma luta que durou dez anos.

Na música brasileira, mais precisamente no rock, Titanomaquia é o título do sétimo álbum de estúdio dos Titãs, que no início dos anos 90 direcionavam seu som para algo muito mais próximo do que se fazia em Seattle do que em qualquer outro lugar do mundo.

Corria o ano de 1992 e o grupo sofria sua primeira baixa. Arnaldo Antunes, cabeça pensante, compositor de vários dos clássicos titânicos desde a formação do grupo e líder natural da banda no palco, parte para carreira solo. Porém, os laços não são rompidos e ele contribui com várias músicas do novo disco.

Lançado um ano antes da debandada de Arnaldo, Tudo ao Mesmo Tempo Agora fora a primeira guinada do grupo rumo a sonoridades mais, digamos, sujas, mais pesadas. E por isso mesmo, foi massacrado pela crítica musical. Titanomaquia foi a cereja do bolo. Tanto que o disco foi produzido por Jack Endino, que trabalhara com o Nirvana em Bleach, primeiro disco do grupo de Kurt Cobain.

Essa guinada dos Titãs continuava incomodando a crítica. Nem todos foram receptivos quanto à mudança de postura do grupo no palco e à atitude sonora, com mais guitarras, mais vocais gritados e torrentes de palavrões. Nem tudo foi tão ruim, porque alguns fizeram resenhas elogiosas ao disco e, se as vendas não foram tão boas quanto nos tempos de Cabeça Dinossauro Ô Blesq Blom, as apresentações ao vivo continuavam ótimas – como sempre.

As rádios roqueiras tocaram várias das faixas, em especial “Será que é disso que eu necessito?”, de vocais urrados por Sérgio Britto e a ótima “Nem sempre se pode ser Deus” (‘Por isso que estou gritando… por isso que estou gritando… por isso que estou gritando!’), em excelente performance de Branco Mello.

O grupo mantém a velha veia irônica em músicas como “Taxidermia” (‘Se eu tivesse seus olhos eu seria famoso!’), “A verdadeira Mary Poppins” (‘Eu sou o verdadeiro Bruce Lee… eu sou o verdadeiro Bob Marley… eu sou o verdadeiro Peter Sellers… eu sou a verdadeira Mary Poppins… eu sei que estou fedendo, eu sei que estou apodrecendo’), “Felizes são os peixes” (‘Tanto faz… é igual… felizes são os peixes… felizes são os peixes’) e “Agonizando” (‘Até morrer, até morrer… até espumar, até ferver… até morrer, até morrer… até secar, até apodrecer… agonizando… agonizando… agonizando’).

Outra música que merece destaque é “Hereditário”, não pelo fato de – assim como “Será que é disso que eu necessito?”, “Nem sempre se pode ser Deus” e “Taxidermia”, ter tido clipe na MTV. Mas sim porque foi a única música com Nando Reis numa das parcerias. O baixista, que já flertava com a MPB, em momento algum estava em sintonia com o viés mais roqueiro e mais punk do grupo – e mesmo assim, apareceu nos shows de cabeça raspada, visual super agressivo.

A turnê de divulgação de Titanomaquia de fato foi um sucesso, os shows foram, em sua grande maioria, sensacionais e com o fim das apresentações, o grupo deu um tempo dos palcos. Vieram projetos paralelos – Sérgio Britto e Branco Mello formaram o grupo Kleiderman com Roberta Parisi; Paulo Miklos lançou um (ótimo) disco solo, assim como Nando Reis e Tony Bellotto estreou como romancista, lançando Bellini e a Esfinge.

Como curiosidade final: o disco veio, na sua versão em LP (que eu tive, claro, afinal estamos falando de 1993, um ano onde nem todo mundo tinha aparelho de reprodução de Compact Disc), num invólucro preto com o nome do álbum em uma tipografia de letras bem rústicas – já que na arte final concebida por Fernando Zarif não há uma única menção ao nome do grupo, quanto mais ao nome do disco.

Talvez tenha sido o último suspiro de uma grande banda que deixou sua marca no rock brasileiro porque, a aparentar pela qualidade dos discos que vieram a seguir, a energia titânica de outrora deixou de existir.

Ficha técnica de Titanomaquia
Selo: Warner Music
Gravado entre setembro de 1992 e março de 1993 no estúdio Nas Nuvens, no Rio de Janeiro
Produção de Jack Endino
Duração: 35’57”

Músicas:

1. Será que é disso que eu necessito? (Sérgio Britto)
2. Nem sempre se pode ser Deus (Sérgio Britto/Branco Mello)
3. Disneylândia (Arnaldo Antunes/Paulo Miklos)
4. Hereditário (Arnaldo Antunes/Tony Bellotto/Nando Reis)
5. Estados alterados da mente (Arnaldo Antunes/Branco Mello)
6. Agonizando (Sérgio Britto)
7. De olhos fechados (Arnaldo Antunes/Paulo Miklos)
8. Fazer o quê (Sérgio Britto/Charles Gavin/Arnaldo Antunes)
9. A verdadeira Mary Poppins (Sérgio Britto/Marcelo Fromer/Paulo Miklos)
10. Felizes são os peixes (Sérgio Britto/Branco Mello)
11. Tempo pra gastar (Sérgio Britto/Marcelo Fromer/Charles Gavin)
12. Dissertação do Papa sobre o crime seguida de orgia (Arnaldo Antunes/Branco Mello)
13. Taxidermia (Paulo Miklos/Tony Bellotto/Arnaldo Antunes)

Discos eternos – Voo de coração (1983)

Ritchie - Vôo Do Coração (1983)

RIO DE JANEIRO – Um fenômeno pop como poucas vezes vimos num país que respirava os ares de uma moribunda ditadura. Um artista que não nasceu no Brasil e que conseguiu alcançar níveis estratosféricos de popularidade. Um disco que vendeu tanto ou mais – reza a lenda – que o campeão de faturamento de sua gravadora.

A personagem por trás disso tudo é Ritchie, ou melhor: Richard David Court. Inglês de Beckenham, no condado de Kent, nasceu em 1952 e foi educado em colégios internos antes de ingressar na Universidade de Oxford no curso de Literatura Inglesa. Com 20 anos apenas, abandonou os estudos: tornou-se flautista num grupo de músicas de protesto. Nessa época, ele conheceu Lúcia Turnbull, Liminha e Rita Lee. A convite desta última, Ritchie foi convidado para conhecer o Brasil. Sem saber o que lhe aconteceria dali para a frente.

Fez parte de grupos como o Scaladácida e d’A Barca do Sol, antes de trocar a flauta pelos vocais e cantar músicas em inglês no Vímana, grupo produzido por Patrick Moraz, antigo tecladista do Yes, onde o guitarrista era um certo Lulu Santos e o baterista, um tal de Lobão.

Com o fim do Vímana, graças à debandada de Lulu Santos e ao casamento de Moraz com Liane Monteiro desfeito pela paixão desta última por Lobão, Ritchie ficou uns tempos fora. Amigo de Jim Capaldi, da lendária banda de rock progressivo Traffic, participou de Let The Thunder City, álbum solo do baterista. Ritchie fez os arranjos e foi o vocalista de algumas faixas.

Em 1982, começava a revolução do rock brasileiro com o Circo Voador de Perfeito Fortuna, lançando grupos como o Barão Vermelho e a Blitz, onde Lobão, o mesmo do Vímana, era o baterista – antes de cair fora e lançar o disco Cena de Cinema – que hoje é bradado aos quatro ventos pelo próprio Lobão como um disco pioneiro na cena independente: um erro grave, pois Antônio Adolfo e Tim Maia, nos anos 70, já tinham enveredado por esse caminho.

Nessa época, descontente por não fazer parte daquilo tudo que seu amigo Lobão já fazia, Ritchie lembrou de Bernardo Vilhena, antigo letrista de músicas do Vímana e que fazia parte de um grupo de poetas chamado Nuvem Cigana, onde também se destacavam Chacal, Charles Peixoto e Ronaldo Santos. Com seus textos, eles ajudaram a renovar a poesia brasileira a partir dos anos 70. E Bernardo, na opinião de Ritchie, era o nome perfeito para ajudá-lo a compor canções para lançar o inglês como artista solo por aqui.

Com uma força de Liminha, que produziu a primeira demo num estúdio de quatro canais, Ritchie gravou “Menina Veneno” e “Baby, Meu Bem”. A fita foi levada para a CBS, que percebeu o estouro que a primeira música poderia causar. Um tiro certeiro. Um golaço de Ritchie e Bernardo Vilhena – inesquecível.

Meia noite no meu quarto
Ela vai subir
Ouço passos na escada
Vejo a porta abrir
Um abajur cor de carne
Um lençol azul
Cortinas de seda
O seu corpo nu

Menina Veneno
O mundo é pequeno
Demais pra nós dois
Em toda cama que eu durmo
Só dá você, só dá você
Só dá você!
Yeh! Yeh! Yeh! Yeh!

Seus olhos verdes
No espelho
Brilham para mim
Seu corpo inteiro
É um prazer
Do princípio ao sim

Sozinho no meu quarto
Eu acordo sem você
Fico falando pras paredes
Até anoitecer

Menina Veneno
Você tem um jeito
Sereno de ser
E toda noite
No meu quarto
Vem me entorpecer
Me entorpecer!
Me entorpecer!
Yeh! Yeh! Yeh! Yeh!

Menina Veneno
O mundo é pequeno
Demais pra nós dois
Em toda cama que eu durmo
Só dá você, só dá você
Só dá você!
Yeh! Yeh! Yeh! Yeh!

Meia noite no meu quarto
Ela vai surgir
Eu ouço passos na escada
Eu vejo a porta abrir

Você vem não sei de onde
Eu sei, vem me amar
Eu nem sei qual o seu nome
Mas nem preciso chamar

Menina veneno
Você tem um jeito
Sereno de ser
E toda noite
No meu quarto
Vem me entorpecer
Me entorpecer!
Me entorpecer!
Yeh! Yeh! Yeh! Yeh!

Menina Veneno
Menina Veneno
Yeh! Yeh!
Menina Veneno
Menina Veneno
Yeh! Yeh!

Cabe aqui um parêntese: recentemente, nas redes sociais, muita gente passou a jurar que Ritchie cantava Um abajur cor de carmim e não Um abajur cor de carne, como dito na letra aqui transcrita. Até pode fazer sentido, diante do sotaque do inglês, que transformava palavras paroxítonas em oxítonas.

A popularidade assombrosa da música levou o compacto simples a vendas incríveis. Foram meio milhão de cópias, o que levou a CBS, através do selo Epic, a gravar o primeiro disco de Ritchie, ainda naquele ano de 1983. A gravadora comemorou: afinal, tinha dois artistas com as músicas mais executadas no país – Ritchie e Michael Jackson, que explodia com “Billie Jean”, do clássico álbum Thriller.

Com o auxílio luxuoso de Lulu Santos – que fez a guitarra em “Casanova”, de Liminha no baixo, de Steve Hackett (do Genesis), que faz o belo solo de guitarra da faixa-título e de Lobão na bateria, além de Zé Luiz Segneri no sax e Chico Batera na percussão, Ritchie – pilotando teclados e tocando flauta, logicamente – fez mais estrondo com Voo de Coração.

Além do megahit “Menina Veneno”, ele fez “Casanova” ser trilha sonora de novela das oito (Champagne, em 1984) e estourou – também – com a ótima “Pelo Telefone”, com “A Vida Tem Dessas Coisas” e logicamente, a bela balada que deu título ao disco. Saldo do sucesso de Ritchie: 1,2 milhão de cópias vendidas e uma turnê de divulgação que passou por 140 cidades.

Há quem diga – mas é provável que seja mais uma lenda urbana – que, incomodado com o sucesso de Ritchie e seu 1,2 milhão de discos que aumentaram o faturamento da CBS, ninguém menos que Roberto Carlos teria pedido a cabeça do inglês. Isto cai por terra quando lembramos que o artista lançaria mais dois álbuns pela gravadora – E a Vida Continua, em 1984 e Circular, em 1985.

Um acontecimento que pode ter contribuído para a derrocada de Ritchie como artista pop foi um desentendimento com Leleco Barbosa, filho do apresentador Chacrinha, que o baniu dos shows do circuito suburbano e, por conseguinte, do Cassino do Chacrinha, o programa do popular Abelardo Barbosa nas tardes de sábado. A última música de sucesso lançada por ele, de fato, foi “Transas”, que entrou na trilha da novela Roda de Fogo e entrou no quarto álbum do cantor, em 1987.

Aos 61 anos, com nove discos gravados e mais uma participação no efêmero – e ótimo – grupo Tigres de Bengala, que formou com Cláudio Zoli, Vinícius Cantuária, Dadi, Mu Carvalho e Billy Forghieri, Ritchie ainda é cultuado pelos fãs de seus trabalhos nos anos 80 – e que vão ao delírio com eventuais aparições dele em Festas Ploc ou eventos do gênero, que cultuam fervorosamente aquela década.

Ele pode ser encontrado no twitter com a conta @ritchieguy (“O inglês mais perto de você”, de acordo com seu perfil em 140 caracteres) e, com certeza, guarda boas lembranças daqueles tempos de “Menina Veneno”.

Ficha técnica de Voo de Coração
Selo: Epic/CBS (hoje Sony Music)
Gravado e lançado em 1983
Produzido por Vinyl

Músicas:

1. No Olhar (Ritchie/Bernardo Vilhena)
2. A Vida Tem Dessas Coisas (Ritchie/Bernardo Vilhena)
3. Voo de Coração (Ritchie/Bernardo Vilhena)
4. Casanova (Ritchie/Bernardo Vilhena)
5. Menina Veneno (Ritchie/Bernardo Vilhena)
6. Preço do Prazer (Ritchie)
7. Pelo Interfone (Ritchie/Bernardo Vilhena)
8. A Carta [The Letter] (Thompson)
9. Parabéns Para Você (Ritchie/Bernardo Vilhena)
10. Tudo o Que eu Quero [Tranquilo] (Ritchie)

Discos eternos – Jongo Trio (1965)

TRIO_Jongo+Trio+-+Jongo+Trio+(1965)-image010RIO DE JANEIRO – Houve um tempo, lá pelos anos 60, onde a música brasileira foi levada de roldão por uma verdadeira febre que tomou conta dos bares e boates no eixo Rio-São Paulo onde houvesse espaço para a apresentação dos artistas e para quem quisesse ouvi-los. E foi um tempo em que tivemos a chance de conhecer uma geração fantástica de músicos, das mais diversas tendências e origens.

Muitos desses músicos se agruparam em formações de piano-baixo-bateria, formando trios que entraram para a história. Posso citar aqui o Zimbo Trio, o Manfredo Fest Trio, o Bossa Três, por exemplo. E um dos mais emblemáticos e importantes de todos foi o Jongo Trio.

O grupo era formado pelo pianista Cido Bianchi, que tocava na lendária boate Stardust, o baixista Sabá (Sebastião Oliveira da Paz), residente na Baiúca e o baterista Toninho Pinheiro, que era do grupo de Pedrinho Mattar (que, pelo que soube, é primo bem distante do escriba aqui). Os três eram os músicos mais requisitados no circuito da Bossa Nova em São Paulo, tocando principalmente no Fino da Bossa, o famoso programa de televisão estrelado por Elis Regina e Jair Rodrigues.

Com tantas horas de voo nos palcos e tantos talentos reunidos num único conjunto, ninguém se surpreendeu quando a pequena gravadora Farroupilha, do maestro gaúcho Tasso Rangel, fez uma proposta a Cido, Sabá e Toninho para gravarem um disco que se tornou histórico em todos os sentidos.

Ao contrário da maioria dos trios brasileiros, que eram praticamente instrumentais, o Jongo se destacava pela versatilidade de seus integrantes – todos participavam dos bem-elaborados arranjos vocais concebidos por Cido Bianchi e o repertório escolhido para este trabalho único na história do Jongo Trio é, de fato, primoroso.

Entre os clássicos tocados por eles estão “O Menino das Laranjas”, de Théo de Barros (Compra laranja, doutor… que ainda dou uma de graça pro senhor), a panfletária “Terra de Ninguém”, dos irmãos Marcos e Paulo Sérgio Valle,  a ótima “Seu Chopin, Desculpe”, de Johnny Alf, canções de Luís Chaves/Adílson Godoy (que eram do Zimbo Trio), Vera Brasil e da dupla Evaldo Gouveia/Jair Amorim, duas de Edu Lobo, com parceiros diferentes – “Reza”, com Ruy Guerra e “Arrastão”, já imortalizada por Elis Regina e escrita por Vinícius de Moraes,e talvez a mais bela música de todo o disco, “Feitinha Pro Poeta”, homenagem de Baden Powell e Lula Freire, justa e exatamente para o Vina.

Ah! Quem me dera ter a namorada
Que fosse para mim a madrugada
De um dia que seria minha vida
E a vida que se leva é uma parada

E quem não tem amor não tem é nada
Vai ter que procurar sem descansar
Tem tanta gente aí com amor pra dar
Tão cheia de paz no coração

Que seja carioca no balanço
E veja nos meus olhos seu descanso
Que saiba perdoar tudo que faço
E querendo beijar me dê um abraço

Que fale de chegar e de sorrir
E nunca de chorar e de partir
Que tenha uma vozinha bem macia
E fale com carinho da poesia

Que seja toda feita de carinho
E viva bem feliz no meu cantinho
Que saiba aproveitar toda a alegria
E faça da tristeza o que eu faria

Que seja na medida e nada mais
Feitinha pro Vinícius de Moraes
Que venha logo e ao chegar
Vá logo me deixando descansar

Mesmo com tantas músicas boas, o Jongo Trio não sobreviveria com sua formação original. Cido Bianchi foi “saído” da formação e em seu lugar entrou Cesar Camargo Mariano. Com Sabá e Toninho Pinheiro, surgiu o Som Três, o grupo que acompanhou o auge da carreira de Wilson Simonal entre 1966 e 1970. O Jongo Trio até voltaria a existir com Toninho Pinheiro, já fora do Som Três, tocando com Paulo Roberto (piano) e Humberto Claiber (baixo). Mas a mística já não era mais a mesma.

Ficha técnica de Jongo Trio
Selo: Farroupilha
Gravado no ano de 1965

Músicas:

1. O Menino das Laranjas (Théo de Barros)
2. Feitinha Para o Poeta (Baden Powell/Lula Freire)
3. Ela Vai, Ela Vem (Roberto Menescal/Ronaldo Bôscoli)
4. Eternidade (Luís Chaves/Adílson Godoy)
5. Terra de Ninguém (Marcos Valle/Paulo Sérgio Valle)
6. Seu Chopin, Desculpe (Johnny Alf)
7. Arrastão (Edu Lobo/Vinícius de Moraes)
8. Garota Moderna (Evaldo Gouveia/Jair Amorim)
9. Vai João (Vera Brasil)
10. Reza (Edu Lobo/Ruy Guerra)
11. Balanço nº 1 (Hermeto Paschoal)
12. Deus Brasileiro (Marcos Valle/Paulo Sérgio Valle)

Discos eternos – Video Hits (1982)

49RIO DE JANEIRO – A série dos discos eternos resenhados pelo blog pouco a pouco abre honrosas exceções e desta vez quem aparece aqui não é um trabalho de um único artista ou grupo. É uma coletânea. E das boas.

Lançada pela CBS, hoje Sony Music, em 1982, Video Hits é uma reunião de petardos pop que fizeram muito sucesso no mundo inteiro e que ajudou a lançar vários artistas no mercado brasileiro. Foi graças a esse disco que muita gente conheceu o austríaco Falco, o genial Joe Jackson, o excelente Christopher Cross e também o mestre do soul Marvin Gaye.

Os trabalhos são abertos com “It’s Raining Again”, baladinha do Supertramp, a última lançada com Roger Hodgson ainda como frontman do grupo, que a partir daí experimentaria considerável decadência. Essa música tocou bastante nas rádios, assim como “Sexual Healing”, mais uma das matadoras canções interpretadas por Marvin Gaye, ao nível de “Let’s Get It On” e outros clássicos que ele lançou nos anos 70, auge de sua fase Motown. Marvin estava sumido do mainstream e no ano seguinte, em 1º de abril de 1984, morreu aos 44 anos, assassinado pelo próprio pai.

Phil Collins comparece com a sensacional “I Cannot Believe It’s True”. O baterista e cantor do Genesis, então em carreira solo, acertou no milhar com uma de suas grandes canções, com a marca registrada do artista: uma ‘cama’ de sopros e a bateria caprichada do carequinha genial. Um show!

A quarta faixa é um delicioso pop reggae, do cantor nascido na Guiana inglesa Eddy Grant, “I Don’t Wanna Dance” antecede aquela que, na minha opinião, é a melhor música de todo o disco. Joe Jackson compõs uma obra-prima chamada “Steppin’ Out”. Ele concebia discos conceituais e mesmo assim fazia muito sucesso. Mestre da swing music, é dele também o caprichado score musical do subestimado filme “Tucker, um homem e seu sonho”, estrelado por Jeff Bridges.

Christopher Cross, de muito sucesso com “Sailing” e “Ride Like The Wind”, tinha a sua “All Right”, da mesma safra de clássicos lançados no começo dos anos 80 e que desaguou no tema de “Arthur, O Milionário Sedutor”. Voz inconfundível, arranjos caprichados, o gordinho também era um dos gênios do pop. A faixa desta coletânea tem participação de Michael McDonald, que na época estava no Doobie Brothers.

Mas, tão gênio quanto ele – talvez mais do que todos – era Michael Jackson, que com seu Thriller estrondou mundialmente, onde todas as faixas tocaram nas rádios, feito “Billie Jean”, gostoso clássico dançante do artista e que abria o chamado Lado B.

Na sequência, o melhor da música australiana, pau a pau com o ótimo Midnight Oil: Colin Hay e sua rapaziada traziam a clássica “Down Under”, do Men At Work, grupo que também fez muito sucesso por estas bandas entre os anos 80/90. Cantando em vienense, Johann “Falco” Holzer conseguiu explodir com sua “Der Kommissar”, que ganharia um clip alucinado, faria um tremendo sucesso nas rádios e depois versão em inglês, pelo grupo estadunidense After The Fire. Falco também foi outro dos artistas desta coletânea que perdeu a vida tragicamente, num acidente de moto, na República Dominicana.

Integrante do Steely Dan ao lado do grande Walter Becker, o compositor, arranjador e tecladista Donald Fagen arrebenta com a sensacional “I. G.Y” (What a Beautiful World), sigla em inglês para International Geophysical Year, o ano internacional da geofísica. A música é uma delícia de se ouvir, com fusões de blues e jazz. Sempre bom ouvi-la.

O genial e genioso Prince, então com 25 anos, estava representado pela futurista “1999”, com direito a bateria eletrônica e o vocal característico do baixinho de Minneapolis. É a penúltima faixa do disco, que termina com a melosa “I Won’t Let You Down”, do grupo PhD, que tinha como frontman o cantor Jim Diamond. Talvez a mais fraca das 12 canções escolhidas para uma coletânea verdadeiramente espetacular.

Ficha técnica de Video Hits
Selo: CBS Discos/Sony Music
Lançada em novembro/dezembro de 1982

Músicas:

1. It’s Raining Again (Supertramp)
2. Sexual Healing (Marvin Gaye)
3. I Cannot Believe It’s True (Phil Collins)
4. I Don’t Wanna Dance (Eddy Grant)
5. Steppin’ Out (Joe Jackson)
6. All Right (Christopher Cross)
7. Billie Jean (Michael Jackson)
8. Down Under (Men At Work)
9. Der Kommissar (Falco)
10. I.G.Y. (Donald Fagen)
11. 1999 (Prince)
12. I Won’t Let You Down (PhD)

Discos eternos – Boingo Alive (1988)

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RIO DE JANEIRO – Ícone do pop-rock dos anos 80/90, o grupo Oingo Boingo completava dez anos de estrada em 1988, quando surgiu a oportunidade de lançar um álbum duplo com os grandes sucessos da banda e outras – boas – músicas compostas por Danny Elfman e cia. limitada. Nasceu Boingo Alive, um disco fundamental para conhecer e celebrar a obra do grupo que perdurou até 1995.

Na verdade, o Oingo Boingo, embora tivesse comemorado uma década de som e fúria no fim dos anos 80, nasceu mesmo em 1972. Era um grupo “performático” com o pomposo nome de The Mystic Knights of Oingo Boingo, liderado por Richard Elfman, irmão mais novo de Danny até a ascensão deste ao posto de líder em 1976.

O grupo chegou a mudar de nome mais três vezes: primeiro foi renomeado Clowns of Death, depois Mosley & The B-Men e por último Boingo. Chegou-se à conclusão que se tirassem o The Mystic Knights do nome original, soaria melhor. A banda virou Oingo Boingo desde então e foi assim que ficou mundialmente conhecida.

Explorando diversas vertentes da música, como o ska, o protopunk, a new wave e o jazz, o Oingo Boingo era um grupo incomum para sua época. Além do básico de guitarra-baixo-bateria, a proposta era agregar percussão, teclados e instrumentos de sopro, como poucos grupos de rock faziam. E a mistura deu certo, muito certo.

O grupo começou a emplacar uma música atrás da outra e fez muito sucesso, especialmente no Brasil, graças aos filmes que tinham canções do Oingo Boingo em suas trilhas, como “Fast Times At Ridgemont High” (Picardias Estudantis), “Bachelor Party” (A Última Festa de Solteiro), “Weird Science” (Mulher Nota 1000) e o impagável “Back To School” (De Volta às Aulas), este com direito a uma aparição do grupo numa megafesta na república de uma universidade, com os auspícios da personagem do hilário Rodney Dangerfield.

Boingo Alive foi um disco quádruplo de formato incomum: a banda tocou todas as 30 canções que compunham o álbum como se fosse ao vivo – só que sem plateia. O grupo fez excelentes releituras de suas músicas de 1979 até 1988 e algumas versões “alive” ficaram bem mais populares e mais interessantes de se ouvir por causa da ‘pegada’ que passaram a ter, como foi o caso de “Dead Man’s Party”, “Stay”, “Just Another Day”, “Nothing To Fear (But Fear Itself)”, “Not My Slave”, “We Close Our Eyes”, “Who Do You Want To Be” e várias outras. Houve ainda espaço para duas inéditas – “Winning Side” e uma instrumental, chamada “Return of The Dead Man”.

O álbum teve produção de Steve Bartek, um dos guitarristas do Boingo e de Danny Elfman, que já enveredava pelo caminho de produção e composição de trilhas sonoras de filmes – no que hoje, aliás, é muito bem sucedido. Com o fim do Oingo Boingo, ele tornou-se o compositor favorito de diretores como Tim Burton, para quem faz trilhas há 28 anos. Elfman também tem no currículo trabalhos para Carl Reiner, Martin Brest, Richard Donner, Sam Raimi, Warren Beatty, Howard Deutch, Barry Sonnenfeld, Gus Van Sant, Taylor Hackford e Ang Lee.

É… o cara não é fraco, não.

Ficha técnica de Boingo Alive
Selo: MCA Records / Universal Music
Gravado “ao vivo” entre 1987 e 1988
Produzido por Danny Elfman e Steve Bartek

Músicas:

Disco 1

1. Dead Man’s Party
2. Dead or Alive
3. No Spill Blood
4. Stay
5. Cinderella Undercover
6. Home Again
7. Help Me
8. Just Another Day
9. It Only Makes Me Laugh
10. My Life
11. Nothing To Fear (But Fear Itself)
12. Not My Slave
13. We Close Our Eyes
14. Elevator Man
15. Return of The Dead Man (instrumental)

Disco 2

1. Winning Side
2. Wild Sex (In The Working Class)
3. Grey Matter
4. Private Life
5. Gratitude
6. No One Lives Forever
7. Mama
8. Capitalism
9. Who Do You Want To Be
10. Sweat
11. Violent Love (Willie James Dixon)
12. On The Outside
12. Only A Lad
13. Goodbye, Goodbye
14. Country Sweat
15. Return of The Dead Man 2 (instrumental)

Discos eternos – A hard day’s night (1964)

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RIO DE JANEIRO – Bastou Ringo Starr proferir num dia de ensaios a frase “It’s a hard day’s night”, que aconteceu o estalo. Estavam aí, em uma só tacada, o nome de mais um disco e do primeiro filme dos Beatles.

A agenda da banda já estava apertada e ir para a telona era só o que lhes faltava: afinal, vendiam discos como água na Inglaterra e EUA, faziam turnês disputadíssimas, divertidos programas de rádio – cujas gravações originaram diversos discos tão bons quanto póstumos e – claro – apareciam na TV, onde não raro faziam números inesquecíveis em programas de auditório como o Ed Sullivan Show, ou de comédias, quando chegaram a fazer uma versão hilária de “Moonlight Bay”, na TV inglesa, no programa de Eric Morecambe e Ernie Wise.

O terceiro disco dos Beatles foi concluído a toque de caixa, assim como o filme – produzido pela United Artists e com direção de Richard Lester. John Lennon e Paul McCartney tiveram meras duas semanas para compor as canções que fizeram parte do filme, as sete primeiras do “lado A” dos antigos vinis. E não por acaso, este foi o único dos 13 discos oficiais dos Fab Four com todas as faixas “assinadas” Lennon-McCartney.

E apesar da rapidez com o que o trabalho teve de ser feito, o disco é repleto de clássicos do grupo. John Lennon predomina e brilha intensamente cantando dez das 13 canções, começando pela faixa-título, a belíssima balada “If I fell” e “I’ll be back”, a última do álbum. Paul McCartney não faz feio, com outra música ao estilo Macca – “And I love her” e a ótima “Can’t buy me love”. A outra música do baixista é “Things we said today”, outro hit do grupo.

“Can’t buy me love”, aliás, teve de ser gravada no estúdio Pathé Marconi, em Paris (o filme foi rodado na França) e além desta, os Beatles fizeram duas versões em alemão para “She loves you” e “I wanna hold your hand”, rebatizadas “Sie liebt dich” e “Komm, gib mir deine hand” – porque no começo da carreira, quando ainda eram quinteto e tinham Stuart Sutcliffe no baixo e Pete Best na bateria, o grupo fez longas temporadas na Alemanha, onde o culto a banda era grande já em 64.

George Harrison teve a oportunidade de cantar apenas uma música, “I’m happy just to dance with you” e para Ringo, desta vez, não sobrou nada a não ser contribuir com a cozinha beatle.

Com músicas que grudavam feito chiclete nos ouvidos, A hard day’s night tinha um pecado: ser um disco curto, com apenas meia hora de músicas – menor que o antecessor. Mas foi mais uma prova de que os Beatles, como grupo, queriam voar cada vez mais e mais alto.

Ficha Técnica de A Hard Day’s Night
Selo: Parlophone / EMI
Produção de George Martin
Gravado na Inglaterra e em Paris, em 1964
Tempo total das faixas: 29’47”

Músicas:
1. A hard day’s night (Lennon-McCartney)
2. I should have known better (Lennon-McCartney)
3. If I fell (Lennon-McCartney)
4. I’m happy just to dance with you (Lennon-McCartney)
5. And I love her (Lennon-McCartney)
6. Tell me why (Lennon-McCartney)
7. Can’t buy me love (Lennon-McCartney)
8. Anytime at all (Lennon-McCartney)
9. I’ll cry instead (Lennon-McCartney)
10. Things we said today (Lennon-McCartney)
11. When I get home (Lennon-McCartney)
12. You can’t do that (Lennon-McCartney)
13. I’ll be back (Lennon-McCartney)

Discos eternos – Disraeli gears (1967)

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RIO DE JANEIRO – Ahmet Ertegun, falecido em dezembro de 2006, tem como um de seus grandes méritos a influência direta na formação do power trio mais cool dos anos sessenta. Afinal de contas, foram três músicos com diferentes influências que, enquanto tocaram juntos, revolucionaram a música no seu tempo.

Senão vejamos: o guitarrista, um certo Eric Clapton, era um herdeiro direto das melhores tradições do blues, como já demonstrara no primeiro grupo em que tocou – os Yardbirds; Jack Bruce, o baixista, tinha formação de música indiana além de fortes raízes no jazz; e o baterista Peter “Ginger” Baker, um monstro no seu instrumento, guardou muito bem as lições que aprendeu com percussionistas africanos.

Desta união de três feras surgiu o Cream. E o grupo é pule de dez quando lembrado acerca de influências para diversos estilos musicais: o jazz-fusion, o hard rock e dizem, até, o rock progressivo.

O certo é que os três juntos formavam uma massa de esporro sonoro como nunca se vira na Atlantic Records até aquela época. Quando foram gravar Disraeli Gears em 1967, eles ligavam seus amplificadores Marshall a todo volume e faziam coisas que poucos artistas imaginaram ser possíveis. Efeitos psicodélicos, pedais wah-wah, bateria com dois bumbos, baixo distorcido… tudo valia a pena para se conseguir mais e melhores sons. Não é à toa que no DVD da série “Classic Albums”, Ahmet Ertegun creditava parte de sua surdez ao altíssimo volume que os três rapazes ingleses impunham aos seus instrumentos.

Grande parte do sucesso de Disraeli Gears pode e deve ser creditado ao trabalho do produtor Felix Pappalardi, baixista de outro lendário power-trio, o Mountain, que buscou dar ao trio uma cara mais comercial. E isto pôde ser sentido logo de cara, quando ele mudou a melodia de “Strange Brew”, a faixa de abertura, tornando-a pop e tremendamente palatável. Isto desagradou Eric Clapton na época – afinal ele e Gail Collins tinham escrito letra e melodia – porque o produtor achara que com a mudança de compassos, saindo do estilo do blues de raiz para uma “canção pop à Paul McCartney”, a coisa pegaria. E pegou.

Mas “Strange Brew” não é a música mais lembrada do álbum. Isto cabe a “Sunshine Of Your Love”, com uma linha de baixo inspiradíssima de Jack Bruce e letra brilhante de Pete Brown. A música é tão boa que até Jimi Hendrix a incluía nas jams que promovia em seus já impressionantes shows com o Experience.

O clima em Disraeli Gears varia de acordo com o teor das letras. Sexo e cabarés em “Dance The Night Away”. Engajamento político em “Take It Back”. Traição em “Outside Woman Blues”. Brigas de casal em “We’re Going Wrong”, para muitos a melhor música da carreira do Cream. Tudo pontuado por guitarras rascantes, os vocais de Jack Bruce e a bateria marcante de Ginger Baker.

Uma outra grande canção é “Tales Of Brave Ulysses”, cuja história é resumida pelo seguinte: o artista plástico australiano Martin Sharp, que comporia a capa do álbum usando colagens e gravuras de Albrecht Dürer, foi apresentado a Clapton num bar chamado Speakeasy, que ficava em Chelsea, por Charlotte Martin, uma linda francesa que namorava o guitarrista. Sharp não se fez de rogado: disse-lhe que tinha uma letra de música e que gostaria de oferecê-la ao grupo. Para sua sorte, ou por um daqueles acasos do destino, a letra que ele escrevera cabia perfeitamente numa melodia que EC tinha escrito junto com seus companheiros do Cream.

A se lamentar é que depois de um início tão promissor, o grupo tenha se desfeito. Ficaram na memória seus brilhantes discos e as memoráveis apresentações ao vivo, onde parecia que os três encarnavam o espírito de músicos históricos como Robert Johnson e Charlie “Bird” Parker.

Ficha Técnica de Disraeli Gears
Selo: Atlantic / Polydor
Produção: Felix Pappalardi
Gravado nos estúdios da Atlantic Records, nos EUA, em maio de 1967
Duração do álbum: 33’30”

Músicas:

1. Strange Brew (Eric Clapton-Gail Collins-Felix Pappalardi)
2. Sunshine Of Your Love (Jack Bruce-Pete Brown)
3. World Of Pain (Gail Collins-Felix Pappalardi)
4. Dance The Night Away (Jack Bruce-Pete Brown)
5. Blue Condition (Ginger Baker)
6. Tales Of Brave Ulysses (Martin Sharp-Eric Clapton)
7. Swlabr (Jack Bruce-Pete Brown)
8. We’re Going Wrong (Jack Bruce)
9. Outside Woman Blues (Arthur Reynolds)
10. Take It Back (Jack Bruce-Pete Brown)
11. Mother’s Lament (Traditional – Arr. Eric Clapton)

Discos eternos – Tim Maia Racional (1975)

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RIO DE JANEIRO – Houve um dia em que Tim Maia trocou o profano dos funks, souls, sambas e xaxados que fizeram parte dos seus quatro primeiros discos – três deles sensacionais, aliás – para mergulhar de cabeça no proselitismo e no sagrado do Racional Superior. Foi a época em que o cantor e compositor se converteu à seita Universo em Desencanto, de Manoel Jacintho Coelho, e fez dois álbuns que entraram para a história.

Primeiro, porque marcaram a única e radical guinada de Tim para algo que ele renegaria para todo o sempre. E segundo porque, apesar das letras repletas de lavagem cerebral, as músicas eram excepcionais, de uma qualidade poucas vezes ouvida neste país nos anos 70.

Autodenominado Tim Maia Racional, ele já estava a pleno vapor com os músicos da Banda Seroma na pré-produção de um disco duplo que seria lançado pela RCA Victor, a primeira gravadora dele após a ruptura de contrato com a Philips, de onde saiu no fim de 1973. As músicas estavam com as bases prontas e empolgavam o cantor e os músicos. Mas aí houve a guinada para o Racional Superior, a conversão do cantor ao Universo em Desencanto e a RCA assustou-se. Não quis fazer o disco com mensagens filosófico-religiosas e excusou-se de se associar a qualquer seita. Como resultado, Tim lançou-o de forma independente pelo seu selo Seroma (a junção das iniciais do seu nome, Sebastião Rodrigues Maia).

Com a conversão, Tim partiu para a troca das letras de TODAS as canções que já estavam prontas, mas com os mesmos arranjos. “Adiós San Juan de Puerto Rico”, uma composição bastante percussiva de letra do paraguaio Fábio, transformou-se em “Quer queira, ou não queira”. Uma das músicas que seriam dedicadas a Geisa, mãe de seu filho Carmelo e do adotado Márcio Leonardo (o Léo Maia, que é cantor), transmutou-se em “Leia o livro Universo em Desencanto”. Uma música de Edson Trindade, o mesmo que compusera “Gostava tanto de você” e ia pela mesma linha de samba-soul, virou a confessional “Paz interior”.

Já não dependo das loucuras
Agora sei o que fazer
Agora sei outra verdade
Estou vivendo com prazer de viver

E agora
Já não dependo de você

Voltou o brilho dos meus olhos
Voltou a paz interior
No Universo em Desencanto
Que reencontrei com muito amor
Racional

E agora
Chegando o bem se afasta o mal

O proselitismo só não atingiu as belíssimas “Ela partiu” e “Meus inimigos”, que ficaram de fora dos dois álbuns originais da série Racional e viraram faixas-bônus nas versões posteriores lançadas em CD. O primeiro disco abre com “Que beleza”, já conhecida do público quando Tim cantou na inauguração do Teatro Bandeirantes, em São Paulo, já com o subtítulo de Imunização Racional.

Em meio a pequenas vinhetas – uma delas, celebrando Manoel Jacintho Coelho como o “Grão Mestre Varonil”: Manoel… o maior homem do mundo… homem sábio e profundo… semeou conhecimento… missionário da pureza… fez brilhar, oh! que beleza… essa nova geração – músicas sensacionais como o deep funk “Bom senso”, mais uma de letra lembrando do passado.

Já virei calçada maltratada
E da virada quase nada
Me restou a curtição
Já rodei o mundo quase mudo
No entanto, num segundo
Este livro veio a mão

Já senti saudade
Já fiz muita coisa errada
Já dormi na rua
Já pedi ajuda

Mas lendo atingi o bom senso
Mas lendo atingi bom senso
A imunização racional

Os batidões que não fariam feio em nenhum disco dos mestres soul e funk da época, ganharam até letras em inglês celebrando a Cultura Racional e o Universo em Desencanto, feito “Rational Culture” e todas as demais faixas seguiam os mesmos preceitos, a mesma linha de pregação e proselitismo, que assustaram também os músicos da Banda Seroma, obrigados que foram a pintar seus instrumentos e a se vestir de branco da cabeça aos pés, por exigência de Manoel Jacintho Coelho, naturalmente.

Foi uma época difícil financeiramente para Tim Maia. Morando na Figueiredo Magalhães, rua das mais movimentadas de Copacabana, ele abandonou a Zona Sul e foi viver em Belford Roxo, então um distante distrito de Nova Iguaçu, na Baixada Fluminense. Celebrava Manoel Jacintho junto a nomes como João Roberto Kelly, Jackson do Pandeiro e o bandolinista Luperce Miranda – todos, assim como ele, convertidos ao Universo em Desencanto. Quem quase entrou para a turma foi Wilson Simonal, na época de sua rumorosa condenação pelo caso em que o cantor fora acusado de mandar torturar seu contador, Raphael Viviani.

Com a produção, lançamento e distribuição do disco feita de forma independente, Tim Maia, que estava à época com 32/33 anos e abandonara as drogas e o álcool, mostrando uma limpidez e uma potência sonoras que nunca mais se ouviu em seus discos, ganhou pouco dinheiro e só teve aborrecimentos, como quando foi chamado para fazer o show de entreato no Festival Abertura, promovido por uma emissora de TV em 1975. O diretor da atração implicou com o branco das roupas e dos instrumentos, o vídeo estouraria em tempos de TV a cores ainda incipiente no país. Tim brigou nos bastidores, mas foi todo carinhos com a inesquecível apresentadora Márcia Mendes, que fez uma matéria com ele, acompanhada pelo país inteiro em horário nobre, num domingo.

Mas chegou o dia em que Tim Maia cansou de buscar “a verdadeira luz da humanidade”. Depois de tantos livros lidos (alguns foram enviados, acreditem, para James Brown, Curtis Mayfield e até John Lennon), teve uma ‘desiluminação’ e abandonou o Universo em Desencanto bem ao seu estilo, quebrando tudo e desfilando uma torrente de palavrões na janela do apartamento da Figueiredo Magalhães, esculachando o antigo guru.

Tim optou por voltar ao profano dos bailes, souls e funks. Bom para seus fãs e para ele, que voltou a despejar uma torrente de sucessos que invadiram as rádios do país inteiro até sua morte prematura e inesperada em 1998, aos 55 anos.

Apesar de nunca mais querer ouvir falar dos discos da fase Racional, disputados a tapa nos sebos por serem raríssimos, Tim Maia teve algumas músicas relembradas por outros artistas. Marisa Monte foi uma que regravou “Que beleza”, assim como Gal Costa. E “O caminho do bem” fez parte da trilha sonora do filme Cidade de Deus.

Em 2011, graças a uma descoberta do produtor Dudu Marote, que encontrou as matrizes com bases já gravadas de músicas inéditas, foi lançado Tim Maia Racional Vol. 3, com seis faixas – anteriormente disponíveis através de downloads piratas. Entre as pérolas nunca lançadas, a sensacional “I am Rational” (I don’t need no dope… I am Rational… And when you read the book… The Universe in Disinchaintment… You don’t need no dope… You gotta be Rational) e “Universo em Desencanto Disco”, já antevendo a chegada da discothéque em terras brasileiras, mas com o proselitismo que foi marca registrada neste período de exceção na vida e na obra do “síndico” Sebastião Rodrigues Maia.

Ficha técnica de Tim Maia Racional
Selo: Seroma (relançado em CD pela Trama)
Gravado entre 1974 e 1975
Produzido por Tim Maia

Músicas (vol. 1)

1. Que beleza [Imunização Racional] (Tim Maia)
2. O Grão Mestre Varonil (Tim Maia)
3. Bom senso (Tim Maia)
4. Energia racional (Tim Maia)
5. Leia o livro Universo em Desencanto (Tim Maia)
6. Contato com o Mundo Racional (Tim Maia)
7. Universo em Desencanto (Tim Maia)
8. You don’t know what I know (Tim Maia)
9. Rational Culture (Tim Maia)
10. Ela partiu [bônus] (Tim Maia)
11. Meus inimigos [bônus] (Tim Maia)

Vol. 2

1. Quer queira ou não queira (Fábio/Tim Maia)
2. Paz interior (Edson Trindade)
3. O caminho do bem (Beto Cajueiro/Serginho Trombone/Paulinho Guitarra)
4. Energia Racional (Tim Maia)
5. Que legal (Tim Maia)
6. Cultura Racional (Beto Cajueiro)
7. O dever de fazer propaganda desse conhecimento (Robson Jorge)
8. Guiné Bissau, Moçambique e Angola (Tim Maia)
9. Que beleza [Imunização Racional] (Tim Maia)

Discos eternos – Phono 73, o canto de um povo (1973)

Phono73

RIO DE JANEIRO – Até 1972, os Festivais de Música promovidos pelas emissoras brasileiras de televisão, com poucas exceções, foram um grande esteio de canções, compositores e intérpretes para este país. Devemos a este tipo de evento o surgimento de gente como Chico Buarque de Hollanda, Edu Lobo, Gilberto Gil, Caetano Veloso, Os Mutantes e muitos outros.

Como o radicalismo e a intolerância estavam muito em voga até nos festivais competitivos, em tempos de ditadura, o interesse se esvaiu e quem pegou o mote no ar foi André Midani, o dinâmico presidente da Philips no Brasil. Com a ajuda de um “grupo de trabalho” encabeçado por Nelson Motta, Armando Pittigliani, Roberto Menescal e Artur da Távola, estabeleceu conceitos entre os artistas e a gravadora soube dividir muito bem o seu cast com artistas de prestígío e outros mais populares. Dentro dessa receita de sucesso, Midani incentivou a realização de um festival não-competitivo só com artistas da própria Philips: nasceu o Phono 73.

De 11 a 13 de maio daquele ano, os principais artistas da companhia estiveram presentes no Palácio das Convenções do Anhembi, escolhido não por acaso. As instalações estavam sendo inauguradas e o auditório com 3,5 mil lugares disponíveis lotou em todas as noites de shows.

A Philips enfrentou uma série de dificuldades com a logística e com otras cositas más. Os spots da iluminação, feita por Ziembinski a pedido de André Midani, graças à  experiência do velho Zimba no teatro brasileiro, explodiam a três por dois. Mas a preocupação maior não era com a luz ou a falta dela. E sim com a quantidade de meganhas à paisana que circulavam pelo auditório do Anhembi, certamente escaldados pela presença de artistas que poderiam criar algum tipo de polêmica.

O Phono 73 previa apresentações individuais dos artistas e alguns deles se reuniriam em duplas para tocar uma ou mais músicas. E uma dessas duplas fez muito barulho: Gilberto Gil e Chico Buarque de Hollanda.

Os dois tinham a pretensão de apresentar a inédita – e também censurada “Cálice”, com uma aliteração bem audível para os militares. Era meio que um cale-se para os que detinham o poder no país, sacaram? Para nenhuma surpresa, o som foi cortado direto da mesa a mando dos policiais, o MPB-4 ajudava trocando os microfones de Chico Buarque e um a um eles foram sendo desligados. Até que o compositor e Gil finalmente desistiram de tocar a canção.

“Vamos ao que pode”, resignou-se Chico, sabendo que também teria o som cortado se cantasse coisas como “Ana de Amsterdam”, com a história lésbica entre Ana e Bárbara, a esposa de Calabar – da também proibida peça “Calabar, o elogio da traição”.

Furioso, Buarque cantou “Cotidiano” e o rock “Baioque”, com o auxílio do MPB-4. Revoltado com a interferência da censura, chamou-a de f… da p… ao fim de sua apresentação. Audacioso, não?

A censura, aliás, papava mosca onde menos se esperava dela. O mesmo MPB-4 apresentou “Pesadelo”, da dupla Paulinho Tapajós e Paulo César Pinheiro, que começava assim:

Quando o muro separa uma ponte une
Se a vingança encara o remorso pune
Você vem me agarra, alguém vem me solta
Você vai na marra, ela um dia volta

E se a força é tua ela um dia é nossa
Olha o muro, olha a ponte, olhe o dia de ontem chegando
Que medo você tem de nós, olha aí

Você corta um verso, eu escrevo outro
Você me prende vivo, eu escapo morto

De repente olha eu de novo

Incrível como uma canção destas não foi censurada e pôde ser cantada no Phono 73.

Politizada e passional, a plateia do Anhembi encarou com desdém alguns dos artistas escalados e vaiou vários deles. Sobrou até para Elis Regina que, por ter aceitado cantar na Olimpíada do Exército em 1972, foi ‘enterrada’ por Henfil no Cemitério dos Mortos-Vivos da personagem Cabôco Mamadô, n’O Pasquim. A Pimentinha enfrentou os apupos com altivez antes de cantar “Cabaré”, da dupla revelação daqueles anos formada por João Bosco e Aldir Blanc, sendo defendida veementemente por Caetano Veloso. “Respeitem a maior cantora do Brasil. Respeitem Elis Regina. Respeitem a música popular brasileira.”

Gal, Nara, Melodia, Caetano, Bethania e... Odair Jose

Registre-se também que o baiano provocou uma boa dose de polêmica no Phono 73. Além de criticar a plateia, dizendo que ‘não existia nada mais Z do que um público classe A’, chamando o evento por tabela de Caphono 73, Caetano fez o dueto mais provocativo e surreal de todo o evento, com Odair José, o “Terror das Empregadas”, que mesmo sendo um artista da corrente brega, taxada de alienada pela turma mais radical de esquerda, sofria censura em decorrência das temáticas polêmicas de algumas de suas músicas, principalmente “Pare de tomar a pílula”.

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Os dois se encontraram num sítio do interior de São Paulo, por iniciativa de Caetano, que queria se apresentar ao lado de Odair e provocar polêmica, atingindo seu intento, pois “Eu vou tirar você desse lugar”, canção apresentada pelos dois, foi vaiadíssima. Odair não se vexou. Mesmo ‘proibido’ e já que o parceiro de palco, revoltado com as vaias, caiu fora de cena, cantou “Pare de tomar a pílula”. Mais vaias.

O Phono 73 teve coisas interessantes, como Maria Bethânia e Gal Costa dividindo microfones numa emocionada interpretação de “Oração a mãe menininha”, de Caymmi, que acabou com as duas se beijando na boca; Toquinho e Vinícius desfilando grandes composições feito “Regra três”, “Samba de Orly” e “Meu pai Oxalá”; Ronnie Von com “Vai depressa”; o emergente talento de Raul Seixas na anárquica apresentação de “Loteria de Babilônia”, Jorge Benjor (ainda Jorge Ben) eletrificando e suingando sua “Mas que nada”, integrando-a com “É de manhã”, de Caetano Veloso, e até mesmo Wilson Simonal, que já estava em processo de fritura no meio artístico, cantando o “Hino ao Senhor”, composição de Tony Osanah, antigo integrante dos Beat Boys.

Interessante notar que, na capa do álbum triplo originalmente lançado, depois convertido para dois CDs (que ganharam um inédito registro em DVD graças a um material que nunca tinha sido editado e que pertence ao acervo de Guga de Oliveira, irmão de José Bonifácio de Oliveira Sobrinho), constava na arte as imagens de Hermeto Paschoal, Luiz Melodia, do grupo nordestino Quinteto Violado, Os Mutantes e Rita Lee, que ficaram de fora do disco. Os motivos que levaram estes últimos a não figurar com suas faixas são óbvios: ainda em 73, Os Mutantes foram dispensados da gravadora. E Rita Lee, que tocou em dueto com Lúcia Turnbull formando as chamadas Cilibrinas do Éden, fez uma apresentação que beirou o melancólico. Nada aos pés do que ela faria como a rainha do rock brasileiro.

Ficha técnica de Phono 73, o canto de um povo
Selo: Philips/Mercury/Universal Music
Produção de Nelson Motta, Roberto Menescal e Armando Pittigliani
Gravado ao vivo de 11 a 13 de maio de 1973 no Palácio das Convenções do Anhembi, em São Paulo

Músicas:

Disco #1

1. Regra três (Vinícius de Moraes) [Toquinho e Vinícius]
2. Samba de Orly (Chico Buarque de Hollanda) [Toquinho e Vinícius]
3. Orgulho de um sambista (Gilson de Souza) [Jair Rodrigues]
4. Sou da madrugada (Gilson de Souza/Wando) [Jair Rodrigues]
5. Hino ao Senhor (Tony Osanah) [Wilson Simonal]
6. Rock da barata (Jorge Mautner) [Jorge Mautner]
7. Tudo se transformou (Paulinho da Viola) [Caetano Veloso]
8. Eu vou tirar você desse lugar (Odair José) [Caetano Veloso e Odair José]
9. Vai depressa (Willy Verdaguer) [Ronnie Von]
10. Loteria de Babilônia (Raul Seixas/Paulo Coelho) [Raul Seixas]
11. Me acende com teu fogo (Erasmo Carlos/Roberto Carlos) [Erasmo Carlos]
12. Medley – Sentado à beira do caminho (Erasmo Carlos/Roberto Carlos)/Foi assim (Renato Corrêa/Ronaldo Corrêa)/Festa de arromba (Erasmo Carlos/Roberto Carlos) [Wanderléa e Erasmo Carlos]
13. É com esse que eu vou (Pedro Caetano) [Elis Regina]
14. Ladeira da preguiça (Gilberto Gil) [Elis Regina e Gilberto Gil]
15. Filhos de Gandhi (Gilberto Gil) [Gilberto Gil]
16. Medley – Mas que nada (Jorge Benjor)/É de manhã (Caetano Veloso) [Jorge Benjor]

Disco #2

1. Zumbi (Jorge Benjor) [Jorge Benjor]
2. Não tem perdão (Ivan Lins/Ronaldo Monteiro de Souza) [Ivan Lins e MPB-4]
3. Pesadelo (Maurício Tapajós/Paulo César Pinheiro) [MPB-4]
4. A alegria continua (Noca da Portela/Mauro Duarte) [MPB-4]
5. Baioque (Chico Buarque de Hollanda) [Chico Buarque]
6. Manera, fru-fru, manera (Raimundo Fagner) [Fagner]
7. Jazz potatoes (Jorge Benjor) [Jorge Benjor e Gilberto Gil]
8. Diz que eu fui por aí (Zé Keti) [Nara Leão]
9. Quinze anos (Naire/Paulinho Tapajós) [Nara Leão]
10. Movimento dos barcos (Jards Macalé/Capinam) [Jards Macalé]
11. Trem das onze (Adoniran Barbosa) [Gal Costa]
12. Sebastiana (Rosil Cavalcanti) [Gal Costa]
13. Oração de Mãe Menininha (Dorival Caymmi) [Gal Costa e Maria Bethânia]
14. Preciso aprender a só ser (Gilberto Gil) [Maria Bethânia]
15. Trampolim (Maria Bethânia/Caetano Veloso) [Maria Bethânia]
16. A volta da Asa Branca (Luiz Gonzaga) [Caetano Veloso]

Discos eternos – Santana III (1971)

allcdcovers_santana_santana_iii_199RIO DE JANEIRO – Ainda sob as influências de sua monumental aparição em Woodstock, uma muito bem-sucedida incursão no Montreux Jazz Festival e diversas e sensacionais apresentações mundo afora, que incluíram shows no Theatro Municipal do Rio de Janeiro e também no Festival Internacional da Canção (FIC), Carlos Santana lançou em 1971 seu terceiro disco com a primeira formação da Santana Band, ainda com Gregg Rolie (teclados/percussão/vocal), Dave Brown (baixo), Mike Shrieve (bateria), Jose Chepito Areas (percussão) e Mike Carabello (percussão), aos quais se juntou um segundo guitarrista e compositor: o talentoso Neal Schön, de 17 anos.

Em suas nove faixas, Santana III carrega a altíssima carga latina que caracterizou os primeiros trabalhos de Santana e se tornou uma marca registrada do guitarrista – mas acrescidas das ótimas performances de Neal Schon em canções mais elaboradas como “Everybody’s Everything” e “No one to depend on”, um dos muitos clássicos assinados por Gregg Rolie em parceria com Mike Carabello e Coke Escovedo.

O disco abre com “Batuka”, uma aula de música instrumental percussiva, balançante e com um alucinante solo de guitarra. Outro tema instrumental de grande destaque é “Toussaint l’Overture”, que até hoje é tocada por Santana em seus shows. O tempero chicano vem em “Guajira” (nome de uma dança cubana), com letra em espanhol e em mais uma homenagem a Tito Puente, lenda do suingue latino e percussivo, com uma cover de “Para los rumberos”.

Santana assina sozinho apenas uma faixa, a ótima “Everything’s coming our way” e entre as demais faixas, destaque para a sensacional “Jungle Strut”, de Eugene ‘Jug’ Ammons, que acabaria virando tema de abertura do inesquecível programa Bike Show, do meu querido amigo João Mendes.

Um disco tão bom feito este só poderia atingir número #1 nas paradas de sucesso, o que de fato aconteceu. Aliás, foi o primeiro álbum de Santana a chegar no topo e o Guinness Book of Records mostra que o guitarrista esperou 28 anos para ver um novo álbum como número #1 da Billboard: a façanha foi alcançada com Supernatural, o maravilhoso disco de Santana com outros artistas, lançado em 1999.

Anos depois do lançamento original, a Sony Music relançou Santana III numa edição chamada Legacy Edition com as faixas originais mais o registro de sua histórica apresentação no Fillmore West. Em 98, viria uma reedição do álbum com três faixas-bônus, também retiradas do show do Fillmore: “Batuka”, “Jungle Strut” e “Gumbo”, que entrou na Legacy Edition como um registro em estúdio.

Nos anos 70/80, os trabalhos de Santana seriam mais ‘estanques’ e ele emplacaria apenas um hit aqui, outro acolá. Após a gravação deste disco, a Santana Band sofreu suas primeiras baixas: Gregg Rolie e Neal Schön foram embora para fundar o Journey. Mas o indelével talento do guitarrista e líder permanece vivo, para o nosso deleite.

Ficha técnica de Santana III
Selo: CBS/Sony Music
Gravado entre janeiro e 4 de julho de 1971 nos Estúdios Columbia, em San Francisco (EUA)
Produzido por Santana Band
Tempo: 41’26″

Músicas:

1. Batuka (Chepito Areas-Dave Brown-Mike Carabello-Gregg Rolie-Mike Shrieve)
2. No one to depend on (Coke Escovedo-Gregg Rolie-Mike Carabello)
3. Taboo (Chepito Areas-Gregg Rolie)
4. Toussaint l’Overture (Carlos Santana-Chepito Areas-Dave Brown-Gregg Rolie-Mike Carabello-Mike Shrieve)
5. Everybody’s everything (Carlos Santana-Tyrone Moss-Milton Brown)
6. Guajira (Chepito Areas-Dave Brown-Rico Reyes)
7. Jungle Strut (Jug Ammons)
8. Everything’s coming our way (Carlos Santana)
9. Para los rumberos (Tito Puente)

Discos eternos – Nothing Like The Sun (1987)

Sting

RIO DE JANEIRO – Muita gente torce o nariz para este disco solo do Sting, terceiro trabalho do artista britânico após The Dream of Blue Turtles Bring On The Night, gravados em meados dos anos 80. Mas como gosto é uma coisa pessoal, não posso dizer que este álbum é ruim como muitos querem fazer parecer. Está longe de ter o peso do que ele seus companheiros de Police fizeram – e isso é fato. Mas é um disco movido por dezenas de razões.

Um ano antes do lançamento, em 1986, Sting perdeu sua mãe, o que contribuiu para grande parte do tom “sombrio” de algumas canções e, somando-se a isso, o cantor criara um envolvimento muito forte com o movimento da Anistia Internacional, defendendo com unhas e dentes os direitos civis daqueles que tinham sido vítimas da opressão nos tempos das muitas ditaduras sul-americanas.

A música “They Dance Alone” é o grande exemplo desse envolvimento de Sting com os grupos ativistas. Com forte conteúdo político, foi – logicamente – proibida no Chile de Augusto Pinochet e teve o auxílio luxuoso de Mark Knopfler e Eric Clapton, nas guitarras. A canção também se refere à dança das mães que choravam seus filhos desaparecidos, com fotografias penduradas em suas roupas – a chamada Gueca Solo.

Apesar da vertente sombria, o disco é pontuado pela fusão do pop com o jazz e belos arranjos, como os ouvidos em “Be Still My Beating Heart” e em “Englishman in New York”. “Sister Moon”, belíssima canção que abre o lado B do segundo disco do álbum duplo (quando lançado, foi assim), acabou inspirada por uma frase de um soneto de Shakespeare dita por Sting a um homem embriagado com quem encontrara certa feita e lhe perguntara: “How beautiful is the moon?” (Quão bonita é a lua?). A resposta veio na lata: “My mistress eyes are nothing like the sun”. (Os olhos de minha amante nada são diante do sol), o que também contribuiu para o título do trabalho.

“They Dance Alone” não é a única canção política no disco. “History Will Teach Us Nothing” segue esta linha, assim como o reggae “Rock Steady”. Mas talvez a música que mais tenha criado polêmica, além do canto contra a opressão sul-americana, foi “Little Wing”.

Não é para menos: Sting e seus comparsas revestiram o clássico de Jimi Hendrix com uma doçura que nunca foi mostrada de fato nas outras covers, perpetradas por Derek & The Dominos e Stevie Ray Vaughan, por exemplo. Para o arranjo da música, o cantor e compositor chamou o mago Gil Evans e sua orquestra, tirando todo o peso da canção e imprimindo um arranjo com clarinetas, flugelhorn, oboé e outros instrumentos mais sofisticados de sopro.

Aqui no Brasil, o disco foi lançado com uma música cantada por Sting com um português sofrível. “Frágil” (Fragile), canção que encerrou o lado B do primeiro disco, destoava claramente do restante do trabalho, onde o britânico se esforçava claramente para manter o tom da canção vertida por Liluca para um idioma estranho para o cantor.

Com produção a oito mãos, creditada a Sting, Hugh Padgham, Neil Dorfsman e Bryan Loren, o álbum alcançou boas vendas. Nos EUA, fez 2 milhões de cópias, conferindo a Sting o disco duplo de platina. “We’ll be together”, carro-chefe do disco, chegou em #7 nas paradas estadunidenses, enquanto “Be still my beating heart” e o remix de “Englishman in New York” ficaram em #15 na terra de Tio Sam.

Ficha Técnica de Nothing Like The Sun
Selo: PolyGram/Universal Music
Gravado no Air Studios, em Montserrat, de março a agosto de 1987
Produzido por Sting, Hugh Padgham, Neil Dorfsman e Bryan Loren
Tempo total: 54’45”

Músicas:

1. The Lazarus Heart
2. Be Still My Beating Heart
3. Englishman in New York
4. History Will Teach Us Nothing
5. They Dance Alone (Gueca Solo)
6. Fragile
7. We’ll Be Together
8. Straight To Your Heart
9. Rock Steady
10. Sister Moon
11. Little Wing (Jimi Hendrix)
12. The Secret Marriage

(todas as outras composições de Sting, exceto a #11)

Discos eternos – Som Imaginário (1971)

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RIO DE JANEIRO – Confesso que até o reveillón de 1996/1997, desconhecia por completo a existência de um grupo brasileiro chamado Som Imaginário. Em pleno 1º de janeiro, com o som da festa devidamente levado de volta por seu dono para o Rio de Janeiro (a passagem de ano foi em Petrópolis, com dezenas de amigos, num casarão da família de uma amiga minha de faculdade), nos restou apenas uma velha vitrola e discos mais velhos ainda, onde despontavam Colosseum, Camel, Caravan e Som Imaginário.

Eu e um conhecido daquela época, que acho que se tornou músico, fomos ver qual era a desse grupo e ao ouvir a primeira faixa, demos muito boas risadas. Afinal de contas, o que tinha de interessante uma música que dizia “eu vou plantar cenouras na sua cabeça”? Fácil: muita coisa.

Tempos depois, vim descobrir que o Som Imaginário surgira em Minas no fim dos anos 60, para ser a banda de apoio de ninguém menos que Milton Nascimento. O grupo era formado por – vejam bem a turma – Fredera na guitarra-solo (à época assinando Frederyko), Tavito no violão e na guitarra-base, Luiz Alves no baixo, Wagner Tiso no piano e órgão, Zé Rodrix no piano, órgão, flauta e vocais, e Robertinho Silva na bateria. Laudir de Oliveira foi chamado para ser o percussionista, mas durou pouco tempo na função: foi excursionar com o Brazil 69 de Sérgio Mendes.

Essa turma toda tocou em 1970 no famoso show Milton Nascimento, ah, e o Som Imaginário, um espetáculo que foi bem-sucedido e provou que o Som Imaginário era mais do que uma simples banda de apoio, com boas possibilidades até de conseguir contratos para gravar discos. Nesse mesmo ano, o grupo participou do FIC da TV Globo com “Feira Moderna”, composição de Fernando Brant e Beto Guedes. Foram para a final, mas como correu um boato que “BR-3″, de Tibério Gaspar e Antônio Adolfo, com Toni Tornado e o Trio Ternura cantando, venceria a fase nacional do festival, eles não se conformaram: tocaram uma versão fake com um só acorde e sem nenhum sentido.

Apesar disto, “Feira Moderna” fez parte do primeiro álbum do grupo, que veio à luz nesse mesmo ano de 1970. Nesse primeiro trabalho, o Som Imaginário não flertava com o que se convencionava chamar de MPB: era uma mistura poderosa de Beatles, com psicodelia, rock progressivo e a cultura hippie que “fazia a cabeça” da moçada mais jovem.

Divididos entre o grupo e trabalhos paralelos com outros artistas – inclusive Milton Nascimento – os integrantes do Som Imaginário tiveram que se virar sem Zé Rodrix, que sairia do grupo para formar o trio Sá, Rodrix e Guarabyra. Sem ele, o líder natural passou a ser Fredera, que cantou em praticamente todas as faixas do disco de 1971.

A abertura é com a sensacional “Cenouras”, supracitada, onde Fredera e Tavito capricham nas guitarras e o primeiro solta a pérola-mor do disco: eu vou plantar cenouras na sua cabeça… É só a tônica do que o ouvinte poderia encarar nas sete faixas seguintes. Em “Você tem que saber”, com uma levada típica de música regional e farta percussão, o grupo flerta com a MPB renegada no disco anterior, num resultado surpreendentemente bom.

O escracho dá o tom na terceira música. “Gogó (O alívio rococó)” começa com uma seqüência de gritos initeligíveis, pratos, bateria, percussão, acordes dissonantes e uma letra absolutamente hilária que termina assim: Rococó… meu gogó… tua avó… pão-de-ló… bororó… curió… no filó… Sensacional!

“Ascenso” é uma faixa que remete ao disco de estréia de outro grupo que bebia na fonte do prog rock: O Terço. Com um vocal espetacular de Fredera e a belíssima letra de Fernando Brant, é uma das melhores de todo o álbum, com um arranjo caprichadíssimo de Wagner Tiso.

Outro grande destaque é “Salvação pela macrobiótica”, um canto falado engraçadíssimo e anárquico que começa falando do feijão nosso de cada dia e depois embarca numas de que bom mesmo é ficar meditando e comendo arroz integral. A sexta faixa é também de dois mineiros que seriam fornecedores de canções do movimento do Clube da Esquina: Chico Lessa e Márcio Borges compuseram “Ué”, outra com letra viajandona e excelente performance de Tavito e Fredera nas guitarras, além da competentíssima cozinha formada por Luiz Alves e Robertinho Silva.

“Xmas Blues”, como o próprio nome sugere, é um blues que remete a Natal e congêneres, em nova letra hilária de Fredera que diz que o algodão branco imita a neve irreal – provavelmente porque em Minas Gerais neve é artigo inexistente. Por fim, o disco encerra com “A nova estrela”, belíssima composição de Fredera e Wagner Tiso, com o piano e o órgão tocados por este último em absoluto destaque.

Uma senha para o que seria o disco seguinte do grupo – Matança do Porco, gravado em 1973, que seria também o divisor de águas para a carreira de Wagner Tiso. O Som Imaginário ainda tocaria em Milagre dos Peixes, grande álbum de Milton Nascimento algum tempo depois e os fãs mais extremados consideram que este é o quarto e último trabalho de uma banda que deixou sua marca na música moderna brasileira.

Pena que durou tão pouco tempo.

Ficha Técnica de Som Imaginário
Selo: EMI-Odeon
Produzido por Milton Miranda
Gravado nos estúdios da EMI-Odeon no primeiro semestre de 1971
Tempo total: 31’47″

Músicas:

1. Cenouras (Frederyko)
2. Você tem que saber (Chico Lessa/Márcio Borges)
3. Gogó [O alívio rococó] (Frederyko/Wagner Tiso)
4. Ascenso (Fernando Brant/Frederyko)
5. Salvação pela macrobiótica (Frederyko)
6. Ué (Chico Lessa/Márcio Borges)
7. Xmas blues (Frederyko)
8. A última estrela (Frederyko/Wagner Tiso)

Discos eternos – Jimi Hendrix live at Woodstock (1969)

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RIO DE JANEIRO – Aproveitando o embalo da trilha sonora da noite desta sexta-feira, vou falar de um artista que dispensa apresentações. Em sua breve vida e carreira, deixou uma legião de fãs e a certeza de que ninguém – em tempo algum – conseguiu ou conseguirá superar o talento natural ao empunhar uma guitarra. Falo, claro, de Jimi Hendrix.

O músico foi o escolhido pelos produtores Artie Kornfeld e Michael Lang para encerrar o Festival de Woodstock em 1969, não sem antes terem levado um “fora” de Roy Rogers. Com o cachê mais alto de todos os artistas – cerca de US$ 50 mil na época – Jimi, que estava morando nas proximidades de Bethel após a dissolvição do Experience, topou, fechou o contrato e começou a caçar outros músicos para o show.

O fiel Mitch Mitchell tocaria a bateria e Billy Cox foi o escalado com a debandada de Noel Redding. Larry Lee, um velho amigo de Jimi dos tempos de exército, foi chamado para ajudar. Juma Sultan e Jerry Velez seriam os percussionistas.

Os shows atrasaram por conta do mau tempo logo no primeiro dia e Jimi, que fecharia o festival à meia-noite do domingo, 18 de agosto de 1969, entrou no palco quase nove horas após o horário previsto. Ele e os rapazes precederam o grupo de rockabilly Sha-Na-Na e, mesmo com a plateia meia-bomba em razão da debandada geral – afinal, era uma segunda-feira e gente normal trabalha às segundas – Hendrix e os músicos foram calorosamente bem recebidos.

O locutor anunciou a entrada do grupo como “Jimi Hendrix Experience”, no que ele logo rebateu. “Nós nos cansamos do Experience e então mudamos um pouco as coisas. A banda se chama Gypsy Sun And Rainbows. E com certeza não passamos de um bando de ciganos”, disse.

Cigano ou não, o fato é que Hendrix justificou plenamente o cachê e fez um show magnífico. Abriu com “Message To Love” e dedicou a primeira parte a músicas que o público já conhecia bastante, como os blues “Hear My Train a Comin'” e “Red House”, a sensacional “Spanish Castle Magic”, a sensualíssima “Foxey Lady” e ao improviso vertiginoso em “Jam Back The House”.

E ainda viria mais. Jimi teve a ousadia de tocar “Izabella”, uma música que ainda estava absolutamente inédita e só seria lançada anos depois em estúdio num disco póstumo do guitarrista. Ele arrebenta em “Fire” e transmuta “Voodoo Child”, revirando seu clássico do avesso, com solos e improvisos que fazem corar os mais corajosos que ousam reverberar seus acordes como aprendizes do talento do mestre supremo.

Com o jogo ganho, Hendrix decalca “Star Spangled Banner”, em ritmo alucinante, fazendo sua guitarra soar no compasso da bateria de Mitch Mitchell, parecendo que bombas caíam no palco – e nada mais anti-Vietnã do que tocar o hino estadunidense num festival de rock, com a Fender Stratocaster gritando como nunca. “Purple Haze” vem na sequência, numa interpretação arrebatadora, precedida de um longo solo de guitarra. Uma das mais esperadas músicas pela plateia, “Hey Joe” fecha a catártica e inesquecível performance do mago da guitarra no encerramento – com chave de ouro – do festival de Woodstock.

Fica claro que – ao ver as imagens do show – Hendrix carregou quase todo mundo nas costas. Com exceção de Mitch Mitchell, que deu um show na bateria e de Billy Cox, que compôs com ele uma ótima ‘cozinha’, os outros músicos pouco ou nada acrescentaram. Há quem diga que o engenheiro de som Eddie Kramer e o produtor Alan Douglas, na mixagem final para som digital, anularam completamente a presença de Lee, Juma e Velez. Até podemos entender isso como algo justificável, porque, na verdade, o grande astro no palco era ele, Jimi, o Deus da Guitarra.

E uma coisa precisa ser perguntada, embora saibamos a resposta:

Existiu mesmo algum ser terráqueo ao nível de James Marshall Hendrix no quesito guitarrista?

Ficha técnica de Jimi Hendrix Live At Woodstock
Selo: MCA/Universal Music
Gravado ao vivo no Festival de Woodstock em 19 de agosto de 1969
Produzido por Alan Douglas
Tempo total: 96’38”

Músicas:

1. Introduction
2. Message To Love
3. Hear My Train A Comin’
4. Spanish Castle Magic
5. Red House
6. Lover Man
7. Foxey Lady
8. Jam Back The House
9. Izabella
10. Fire
11. Voodoo Child (Slight Return)
12. Star Spangled Banner (Francis Scott Key/John Stafford Smith)
13. Purple Haze
14. Woodstock Improvisation
15. Villanova Junction
16. Hey Joe (Billy Roberts)

Todas as outras músicas de autoria de Jimi Hendrix

Discos eternos – Fruto Proibido (1975)

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RIO DE JANEIRO – Rita Lee Jones ainda era uma Mutante em 1970. Tinha 22 anos apenas quando deu seu primeiro “grito” solo, Build Up. Um grito tímido, que muitos não têm como um grande disco, mas serviu para mostrar que ela não era apenas um rostinho bonito no grupo do qual fazia parte. Depois, veio Hoje é o primeiro dia do resto de sua vida, que soa ainda como um disco d’Os Mutantes – pois, por incrível que pareça, Arnaldo Baptista, Sérgio Dias e Dinho Leme fizeram parte dele.

A garota foi defenestrada por Arnaldo Baptista em fins de 1972 e finalmente pôde dar o grito de alforria, para começar a se consagrar como a rainha do rock no Brasil. Mas para que isso acontecesse, ainda demoraria um pouquinho. Ela errou na dose ao formar com a amiga Lucinha Turnbull o duo Cilibrinas do Éden, de brevíssima vida e depois, decepcionou-se com o resultado de Atrás do porto tem uma cidade, trabalho que marcou o fim do seu contrato com a Philips e fê-la afirmar muito tempo depois. “A gravação que Wanderléa fez de ‘Menino Bonito’ deu um pau na minha”.

Nessa época, Rita já tocava com os tutti buona gente da Pompeia que formavam o grupo Tutti-Frutti: Luis Sérgio Carlini (guitarra), Lee Marcucci (baixo) e Emilson Colantônio (bateria). Este último seria substituído por Franklin Paolillo e foi com esta formação que ela e a banda entraram em estúdio para gravar Fruto Proibido, o álbum que definitivamente consagrou a cantora.

Com produção do engenheiro de som Andy Mills, que fizera vários discos de Alice Cooper, e lançado pelo selo Som Livre, ligado às Organizações Globo, Fruto Proibido é uma das maiores obras-primas da história do rock nacional. Com pitadas de blues, hardcore e glam, Rita e os rapazes do Tutti-Frutti, com o auxílio luxuoso de gente como o genial Manito (o mesmo dos Incríveis, do Som Nosso de Cada Dia e dos Mutantes) e do piano de Guilherme Bueno, fazem a delícia do ouvinte da primeira à última faixa.

O disco oferece uma enxurrada de clássicos, começando com “Dançar para não dançar”, passando pela sensacional “Agora só falta você”, parceria de Luis Sergio Carlini com Rita, que pelo teor da letra ficou com um quê de hino feminista. Sem contar que Paulo Coelho, já brigado com Raul Seixas, compôs com a cantora a bem-humorada “Esse tal de roque enrow” – a visão desesperada de uma mãe sobre o gênero musical. A parceria rendeu outras duas canções: “O toque” e “Cartão postal”.

Rita assinaria ainda, sozinha, outras duas músicas que são obrigatórias em sua galeria de ótimas canções. “Luz Del Fuego”, homenagem à bailarina capixaba Dora Vivacqua, que entre os anos 50 e 60, chocou e revolucionou o país com suas ideias libertárias e o naturismo – ela foi a introdutora das praias de nudismo no país – e a maravilhosa “Ovelha negra”, talvez a letra mais bacana que ela escreveu em toda a carreira. E o solo final de Luís Sérgio Carlini é daqueles que ninguém esquece.

Tanto “Agora só falta você” e “Ovelha negra” foram lançadas com protoclipes no Fantástico, já que o disco era da Som Livre e a execução das mesmas num programa de alto ibope país afora ajudou a catapultar as vendas de Fruto Proibido a patamares incríveis. Rita e o Tutti-Frutti ganharam disco duplo de platina, com inteira justiça, pois o disco atingiu deslumbrantes 700 mil cópias vendidas.

Até 1978, quando a parceria com o grupo se desfez, Rita realmente fazia rock and roll de qualidade e Fruto Proibido é uma espécie de “como fazer rock em português”, muito embora Raul Seixas fosse mestre nessa arte e os grupos progressivos como O Terço e o Som Nosso de Cada Dia também tivessem ótímos discos do gênero. Mas a primeira mulher que entrou de cabeça no gênero foi ela: Rita Lee Jones.

Ficha técnica de Fruto Proibido
Selo: Som Livre
Gravado no Estúdio Eldorado, em São Paulo, em abril de 1975
Produção de Andy Mills
Tempo: 37’12”

Músicas:

1. Dançar para não dançar (Rita Lee)
2. Agora só falta você (Luis Sérgio Carlini/Rita Lee)
3. Cartão postal (Paulo Coelho/Rita Lee)
4. Fruto proibido (Rita Lee)
5. Esse tal de roque enrow (Paulo Coelho/Rita Lee)
6. O toque (Paulo Coelho/Rita Lee)
7. Pirataria (Lee Marcucci/Rita Lee)
8. Luz Del Fuego (Rita Lee)
9. Ovelha negra (Rita Lee)

Discos eternos – Pilantrália (1969)

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RIO DE JANEIRO – Responda se puder: o que artistas como Roberto e Erasmo Carlos, Ronnie Von, Elis Regina, Tony Tornado, Clara Nunes, Fábio, Tim Maia e Wilson Simonal têm em comum? – além do fato de cantarem músicas em português, claro.

Pois é: todos esses nomes estiveram ligados num passado não muito remoto a um sujeito que marcou história na música brasileira e também no mundo do showbiz por se tornar uma personagem das mais controvertidas de todos os tempos: Carlos Eduardo da Corte Imperial.

Nascido na mesma Cachoeiro de Itapemirim de Roberto Carlos, seis anos antes do Rei, em 1935, Imperial foi um marqueteiro avant la lettre, muito além do seu tempo: promoveu o rock and roll, escreveu músicas, produziu discos, descobriu artistas, participou e produziu peças de teatro, escreveu e atuou em filmes, foi jurado e teve programa de televisão, decidiu samba-enredo da Portela, colunista de jornal e revista, vereador, candidato a prefeito… ufa… “tudo ao mesmo tempo”, até sua morte em 4 de novembro de 1992.

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