Outsiders: Stefan Bellof, aquele que poderia ter sido… e não foi

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RIO DE JANEIRO – Enquanto o mundo do automobilismo relembra Ayrton Senna e os 20 anos da perda monumental do brasileiro, no próximo ano os alemães certamente terão motivos para recordar um piloto que tinha tudo para ser o primeiro daquele país a brilhar na Fórmula 1. Não é falácia: é fato. Stefan Bellof era um talento nato e estava na mira de grandes equipes, antes do acidente que o levou com menos de 30 anos de idade.

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Nascido em 20 de novembro de 1957 em Giessen, na então Alemanha Ocidental, Bellof começou seguindo os passos do irmão mais velho, Geörg, logicamente nos karts, praticamente na mesma época que Ayrton Senna, que era pouco menos de três anos mais jovem, em 1973. Logo em seu primeiro ano, foi 4º colocado no Campeonato Alemão. Em 1976, Bellof levou o primeiro título internacional, com o troféu do International Karting Championship, no Grão-Ducado de Luxemburgo. O piloto disputou também o Mundial em Hägen, na Alemanha, e terminou na 13ª posição.

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Geörg foi campeão alemão de Kart em 1978 e dois anos mais tarde, era Stefan quem repetia o feito do mano mais velho. Porém, sua carreira nos monopostos já estava a todo vapor, na Fórmula Ford. Bellof estreara nessa categoria em 1979 com um 2º lugar em Hockenheim e no ano seguinte, o mesmo do título de Campeão Alemão de Kart, ele se consagraria Campeão Alemão de FF1600, com um total de oito vitórias e nove pódios em 12 etapas. Avassalador.

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No ano seguinte, seguiu na FF1600 na defesa do seu título, mas não foi feliz. Fez algumas provas de FF2000 e ainda em 1981 já estava na Fórmula 3, pela equipe de Bertram Schäfer. Mesmo sem disputar as duas primeiras provas daquela temporada, chegou à última etapa com sete pontos de vantagem sobre Frank Jelinski e Franz Konrad, seus rivais na briga pelo título. Fracassou na prova decisiva em Nürburgring e ainda terminou o campeonato em 3º lugar, atrás do campeão Jelinski e do vice Konrad, derrotado por onze pontos.

Para fechar o ano, Stefan voltou à Fórmula Ford e fez uma aparição polêmica no Festival Mundial de Brands Hatch. Acabou excluído de uma das baterias de quartas-de-final, na qual terminara em 6º lugar por “excesso de arrojo”. O piloto fez uma promessa, logo após a desclassificação, ao chefe dos comissários.

“Acompanhe melhor a minha carreira. Estarei aqui de volta à Inglaterra, no ano que vem. E vou vencer minha primeira prova de Fórmula 2”.

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Tanta confiança veio quando Eje Elgh, 3º colocado da Fórmula 2 Europeia em 1981, ficou impressionado com Stefan após o primeiro teste do piloto alemão com um carro da categoria. Em Paul Ricard, na França, Bellof tivera a chance de experimentar um modelo Maurer-BMW em confronto com Alain Ferté e Mike Thackwell. Willy Maurer gostou do que viu e ouviu. Tanto que fechou um contrato com Bellof para que o alemão integrasse sua equipe na Fórmula 2 e também mais um compromisso: Maurer seria, também, o empresário do piloto por um período de oito anos.

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A abertura do Europeu de F-2 em 1982 foi mesmo na Inglaterra, no circuito de Silverstone. Mesmo largando da 9ª posição do grid, Stefan cumpriu a promessa ao comissário de Brands e venceu com 21 segundos de margem para Satoru Nakajima, este a bordo de um March-Honda da equipe de Tetsu Ikuzawa. Não satisfeito, Bellof ganhou também a 2ª etapa, o Jim Clark Memorial Trophy, diante de uma legião de torcedores em Hockenheim, por apenas quatro segundos sobre o belga Thierry Boutsen, com um Spirit-Honda.

Em Thruxton, o piloto bateu logo na primeira volta, envolvido numa colisão com Thierry Tassin e Roberto Del Castello. Foi 5º colocado em Nürburgring, sétimo em Mugello, abandonou em Vallelunga, chegou em nono no circuito francês de Pau e bateu em Spa. Tudo isso antes de voltar ao pódio com um 3º lugar em Hockenheim, na 9ª etapa do campeonato.

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O piloto ainda seria sexto em Donington, na Grã-Bretanha, abandonando em Mantorp Park. Com um 2º lugar em Enna-Pergusa e a quinta posição em Misano Adriático, Bellof somou um total de 33 pontos e acabou o campeonato em quarto lugar. Uma excelente temporada para um estreante como ele.

Em paralelo com a F-2, o jovem piloto, então com 24 anos, estreou no World Sportscar Championship, o Mundial de Carros Esporte. Com um Kremer CK5, o piloto disputou os 1000 km de Spa-Francorchamps. A dupla andou bem até abandonar na 51ª volta com problemas no motor de arranque do protótipo. Na semana anterior, o piloto disputara a Hessen Cup em Hockenheim pelo DRM, certame que tornou-se o embrião do DTM.

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Na temporada de 1983, Stefan seguiu com a Maurer para mais uma temporada de 1982, ao mesmo tempo em que se consolidava como uma das apostas da Porsche para o World Sportscar Championship. Em sua primeira corrida com um Rothmans Porsche 956C, venceu em dupla com Derek Bell os 1000 km de Silverstone – com mais de um minuto de vantagem para Stefan Johansson/Bob Wollek.

Cabe, aliás, uma curiosidade: o tempo da pole de Bellof – 1’13″15, teria classificado o piloto alemão no 12º lugar no grid do GP da Inglaterra de Fórmula 1 em 1981, lá mesmo em Silverstone. Logo depois, o piloto registraria outra marca histórica: no circuito de Nürburgring, em pleno Nordscheleife, Stefan detonou os cronômetros e registrou a volta mais rápida da história da pista – 6’11″13, sendo o primeiro a obter a média horária acima dos 200 km/h no desafiador circuito de 183 curvas e quase 23 km de extensão. Em ritmo de prova, o tempo de 6’25″91 é também o recorde absoluto do Ring. Mas na corrida, Bellof se estatelou na curva Pflanzgarten, abandonando a prova.

O piloto venceu também em Kyalami e em Fuji, no Japão, resultados que deixaram-no em 4º lugar ao fim do campeonato do WSC em 1983.

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Na Fórmula 2, os resultados de Bellof não foram tão brilhantes: chegou em 4º em Silverstone e em segundo no circuito de Jarama, na Espanha. Na prova de rua realizada em Pau, acabou em 3º lugar, mas foi desclassificado. Aliás, ele e seu companheiro de equipe Alain Ferté: os dois Maurer-BMW estavam fora do regulamento, abaixo do peso mínimo limite. Bellof acabou num modesto 9º lugar, com nove pontos.

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O fim do ano de 1983 representou o primeiro contato do piloto com um Fórmula 1. Na verdade, a estreia dele vinha sendo ‘ensaiada’ com constantes boatos da aparição do nome de Bellof na lista de inscritos de várias provas. ATS e McLaren cogitaram oferecer cockpits ao jovem piloto e nesta última, pelas ligações de Stefan com a Porsche, teoricamente as chances eram melhores para o futuro.

Tanto ele quanto campeão e vice da Fórmula 3 inglesa – Ayrton Senna e Martin Brundle – foram agraciados com um teste a bordo de um McLaren MP4/1C-Cosworth. Senna fez seu papel e Bellof, que veio logo depois do brasileiro, quebrou o câmbio do carro, antes que Martin Brundle efetuasse suas primeiras voltas.

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No entanto, a equipe que oferecia a Bellof a chance de estrear na F-1 seria a Tyrrell. O time britânico experimentava um lento processo de decadência e em 1984, a equipe era uma das únicas que ainda apostava nos motores Cosworth V-8, que tinham cerca de 150 HP a menos em relação às unidades com turbocompressores.

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A temporada não começou bem para o piloto alemão, com abandonos nos GPs do Brasil e da África do Sul. Apesar da deficiência do equipamento e do chassi 012, defasadíssimo em relação aos adversários, Bellof conseguiu chegar em 5º lugar no GP da Bélgica, em Zolder. Após mais um abandono em Dijon, no GP da França, veio Mônaco.

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Último no grid, ele passou em décimo-primeiro ao fim da primeira volta. É bem verdade que as duas Renault de Patrick Tambay e Derek Warwick bateram e outros pilotos tiraram o pé. Mas nada exclui os méritos de Bellof, que fez uma corrida tão extraordinária quanto a de Ayrton Senna.

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Na fatídica 31ª volta em que a corrida foi encerrada, o piloto da Tyrrell estava a 21 segundos do líder Alain Prost e a 13.7 de Ayrton Senna. O 3º lugar deu a Bellof mais dois pontos, porque os mesmos foram computados pela metade, uma vez que a prova não chegou a 75% de sua distância para pontuação integral.

Após dois abandonos consecutivos na perna da América do Norte e o 2º lugar de Brundle em Detroit, Bellof acabou vítima de uma falcatrua da equipe Tyrrell: o uso de lastro no tanque de combustível, que fazia o carro ter, na verdade, 80 kg a menos que o permitido no regulamento. Com o tanque vazio, o modelo 012 ficava mais veloz e consequentemente mais estável. E já desde o GP do Brasil havia desconfianças acerca da legalidade dos carros do time, pois Brundle, em determinado momento da prova, parou para reabastecer o carro com… água.

A Tyrrell apelou da eliminação do campeonato e conseguiu dar sequência à temporada: participou normalmente nos GPs de Dallas, Inglaterra e Alemanha, no qual Bellof ausentou-se por um compromisso com a Porsche no World Sportscar Championship em Mosport, no Canadá. Na Áustria, Bellof não conseguiu a classificação e em Zandvoort, o piloto e a equipe disputaram sua última prova em 1984: no intervalo entre o GP da Holanda e a etapa da Itália, a Corte de Apelação da FIA anunciou a exclusão definitiva da Tyrrell do Mundial de Construtores, do restante do campeonato e a cassação dos 12 pontos somados por seus pilotos – oito por Brundle e quatro por Bellof.

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Se na F-1 Bellof acabou prejudicado, no WSC ele foi o melhor piloto do ano. Revezando-se a bordo dos carros da Rothmans Porsche e da Brun Motorsport, o alemão consagrou-se campeão mundial de pilotos do World Sportscar Championship. Venceu em Monza sob grande controvérsia (o carro dele e de Derek Bell estaria fora do peso na vistoria) e também em Nürburgring, Spa-Francorchamps, Mosport e Sandown Park. Levou o título por oito pontos sobre o compatriota Jochen Mass e ajudou na conquista da Porsche entre os construtores.

Não satisfeito, Bellof fechou o ano com mais um caneco: levou o título do DRM com três vitórias e duas pole positions. Também venceu em sua única aparição no Campeonato Japonês de Esporte-Protótipo. Ao todo, foram 16 corridas fora da Fórmula 1 e nada menos que nove vitórias no currículo.

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Bellof renovou com a Tyrrell para o Mundial de 1985 e manteve o vínculo com a Porsche para o WSC, através da Brun Motorsport. A despeito de não competir no GP do Brasil, em Jacarepaguá, fez uma grande corrida no Estoril, mais uma vez mostrando suas qualidades em condições adversas. No toró da prova portuguesa, o alemão largou de 21º e terminou em sexto, somando enfim o primeiro ponto dele para valer na Fórmula 1.

Àquela altura, seu nome começava a ganhar força como o novo piloto da Ferrari para a temporada de 1986. Nas provas seguintes, abandonou em San Marino, não correu em Mônaco e foi 11º colocado no Canadá. No GP dos EUA, em Detroit, mesmo com o carro danificado, Bellof deu um show e chegou em quarto. Nas últimas oportunidades em que competiu com o Tyrrell-Cosworth, ainda foi o 13º na França e 11º na Inglaterra.

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A Tyrrell costurou um acordo com a Renault e na segunda metade do campeonato, seus carros teriam motores turbo. O modelo 012 foi reformulado, recebendo um reforço no chassi para suportar a potência monstruosa dos motores franceses, especialmente em classificação. No GP da Alemanha, Bellof estreou a Tyrrell-Renault em Nürburgring, chegando em oitavo. E foi sétimo no GP da Áustria, antes de abandonar no GP da Holanda, em Zandvoort.

O piloto não podia imaginar que aquela seria sua última corrida de Fórmula 1.

FIA World Endurance Championship

Nos finais de semana em que as provas não coincidiam, Bellof se juntava a Thierry Boutsen na condução do Brun Porsche 956C durante a temporada de 1985 do World Sportscar Championship. Os 1000 km de Spa-Francorchamps, em 1º de setembro de 1985, seriam a quarta aparição do piloto na competição.

A dupla largara da 3ª posição, oito décimos atrás do Lancia LC2 pole position e na altura da 78ª volta, Bellof, que assumira a pilotagem no lugar de Boutsen, lutava contra o ídolo local e lenda da Endurance Jacky Ickx pela liderança da corrida. Os dois seguiram da La Source em direção à reta que leva ao complexo Eau Rouge-Raidillon, com Ickx à frente de Bellof. O piloto tentou a ultrapassagem num dos pontos mais perigosos da pista e o belga não cedeu. O resultado…

Após o acidente, houve incêndio no Porsche de Bellof e os comissários e a equipe de resgate trataram de entrar em ação. Mas não havia nada que pudesse ser feito: aos 27 anos, em decorrência de inúmeras lesões internas, Stefan Bellof morrera. Em respeito ao ocorrido, a prova foi encerrada com 150 km por percorrer.

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A morte prematura de Bellof não foi a única daquele ano no WSC: Manfred Winkelhock fora vítima de um estouro de pneu a alta velocidade no circuito de Mosport, perdendo o controle do carro e também a vida, igualmente a bordo de um Porsche 956. Após estas tragédias, cada vez menos pilotos de Fórmula 1 continuaram se revezando entre os monopostos e os protótipos.

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Foi uma pena que uma carreira tão promissora tenha se encerrado de forma tão abrupta, tão trágica. E pensar que Bellof era o ídolo de infância de um certo Michael Schumacher que, talvez inspirado por seus feitos nas pistas, ficou então com o posto de maior promessa alemã – tornado realidade com sete títulos e anos de serviços prestados à Ferrari.

Podia ter sido diferente…

Direto do túnel do tempo (151)

1468659_681003891932580_2094514114_n (1)RIO DE JANEIRO – O ano é 1971. Chegada dos 1000 km de Spa-Francorchamps, uma das mais renhidas da história do finado e saudoso World Sportscar Championship. A bordo do Porsche 917 K #21, Pedro Rodriguez/Jackie Oliver e no #20, Jo Siffert/Derek Bell. Após 71 voltas pelos 14,1 km do antigo e desafiador traçado, a diferença entre os dois carros da equipe Gulf Racing John Wyer foi de apenas quatro décimos de segundo.

Linda foto de Erich Mullender, roubartilhada do grupo Sportscar Portugal, do qual faço parte no Facebook.

Há 42 anos, direto do túnel do tempo.

Direto do túnel do tempo (139)

tumblr_mvbympkEia1rkno9vo1_1280RIO DE JANEIRO – Uma Alfa Romeo T33/3 numa estrada da Itália: só podia ser na Targa Florio, lendária corrida disputada na Sicília num percurso tortuoso de 72 km de extensão, o Piccolo Circuito delle Madonie (que ironia o piccolo, não?) – três vezes mais longo que o Nordscheleife de Nürburgring.

Nos anos 70, uma volta completa pela pista, que passava por dezenas de cidadelas daquela região do país, durava pouco mais de 34 minutos. A Targa Florio tinha duração de 11 voltas e até 1973, se não me engano, fez parte do World Sportscar Championship, o Campeonato Mundial de Marcas.

O carro #5 que ilustra esta postagem era guiado no dia 16 de maio de 1971 pelo holandês Toine Hezemans e pelo italiano Nino Vaccarella. A dupla fez a pole position e derrotou a poderosa esquadra da Porsche, que naquela corrida alinhou o modelo 908/03, cujas características eram mais adequadas a um circuito do gênero do que o 917. Num carro idêntico, só que com o número #2, Andrea de Adamich/Gijs Van Lennep, outra dupla formada por um italiano e um holandês – coincidência, hein? – chegaram em segundo.

Há 42 anos, direto do túnel do tempo.

Direto do túnel do tempo (132)

5588475782_abf08af6ab_zRIO DE JANEIRO – Como bem salientou o amigo português Paulo Alexandre Teixeira, o @Speeder76 do twitter e blogueiro do ótimo Continental Circus (com link aqui à direita), os pais que perderam seus filhos na última semana chegaram a correr juntos no carro da foto que ilustra este post.

Guy Edwards, que hoje chora a morte de Sean Edwards e Emilio de Villota, enlutado pela filha Maria de Villota, foram ‘residentes’ no AFX Aurora Championship, um campeonato britânico de antigos carros de Fórmula 1, onde o britânico andou com o Fittipaldi F5A e o espanhol, além de guiar os McLaren M23, também esteve a bordo de um Lotus 78. Ambos também têm em comum algo mais que os filhos tragicamente desaparecidos e o fato de correrem no Mundial de Endurance em 1981. As carreiras de ambos na categoria máxima foram esparsas e dignas de pouco registro. Talvez Edwards leve como maior lembrança a condecoração de honra que recebeu do Império Britânico por salvar Niki Lauda de sua Ferrari no GP da Alemanha de 1976, em Nürburgring.

Enfim, os dois estiveram juntos nas 6h de Silverstone, disputadas em 10 de maio de 81 como 6ª etapa do World Sportscar Championship. Eles dividiram o protótipo Lola T600 inscrito com o número #1 e dotado de motor Ford Cosworth DFV V8 3 litros. Largaram em segundo com o tempo de 1’22″620, superados pelo Porsche 908/80 #5 de Jochen Mass/Reinhold Joest/Volkert Merl, pole position com 1’21″320.

Nenhum dos dois carros que largou à frente do pelotão de 36 carros terminou a disputa: o Porsche bateu e o Lola de Edwards/de Villota ficou sem combustível e desistiu na 94ª volta. A vitória foi do Porsche 935 J Grupo 5 #22 do Vegla Racing Team, guiado por Walter Rörhl/Dieter Schornstein/Harald Gröhs, duas voltas à frente da BMW M1 #40 de Steve O’Rourke/David Hobbs/Derek Bell.

Há 32 anos, direto do túnel do tempo.

Esporte-Protótipos Inesquecíveis – Alpine Renault (1973/1978)

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RIO DE JANEIRO – A saga desse protótipo que é um ícone do automobilismo mundial durou cinco anos. Os Alpine-Renault, junção do fabricante francês com a lendária criação de Jean Rédélé, fincaram seu nome no esporte de 1973 a 1978 e conquistaram grandes resultados dentro das pistas.

Essa história começa quando a Societé des Automobiles Alpine, de Rédélé, tem 55% de suas ações absorvidas pela Régie após a deflagração da crise mundial do petróleo. A Renault, por seu turno, estava bastante interessada em promover sua marca nas competições de carros esporte e assim sendo, foi construído um primeiro carro para o Campeonato Europeu de Esporte-Protótipos 2 litros, com regulamento bastante semelhante na parte mecânica à Fórmula 2.

O primeiro carro foi o Alpine Renault A440 (topo do post), que nasceu em 1973 e foi impulsionado por um motor Gordini V6 naturalmente aspirado, com 285 HP de potência. Não foi suficiente, porém, para derrotar Chris Craft e a Lola, que se sagraram campeões daquela temporada.

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Em 1974, o investimento maciço da Renault proporcionou a entrada da equipe com o modelo A441 e um time de pilotos liderado por Gérard Larrousse, Alain Serpaggi, Alain Cudini e Jean-Pierre Jabouille. O motor ganhou ligas leves e magnésio na sua construção e o carro foi equipado com uma caixa de câmbio Hewland FG400. Aí não teve jeito: com sete vitórias, a Alpine Renault foi campeã entre os construtores. E entre os pilotos, Serpaggi levou o caneco naquela que foi a última temporada do Europeu, já que os carros 2 litros foram ‘convocados’ em 75 para compor grid no World Sportscar Championship, que estava bastante esvaziado.

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Para o ano de 1975, veio o Alpine Renault A442, um protótipo construído com monocoque misto de aço e alumínio, cujo motor ganhara um turbo Garrett para que o bólido fosse enquadrado no regulamento técnico do Grupo 6, onde os motores aspirados tinham 3 litros de capacidade cúbica. Usando a proporção de 1 para 1,4, a cilindrada máxima de qualquer unidade turbocomprimida era de 2.142cc. O motor do Alpine tinha 1.997cc com seis cilindros e ângulo de 90º, debitando inicialmente 495 HP a 9.900 rpm.

A estreia do carro aconteceu nos 1000 km de Mugello, em 23 de março de 1975. Após 150 voltas, Jean-Pierre Jabouille/Gérard Larrousse levaram o protótipo amarelo número #5 a uma sensacional vitória, derrotando a favorita Alfa Romeo e também a Porsche.

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E ficou por aí: a Alfa começou a enfileirar uma vitória atrás da outra com os carros alinhados pelo WKRT de Willi Kauhsen e, para piorar, até uma A441 pilotada pela dupla Marie-Claude Beaumont/Lella Lombardi apareceu no campeonato e, vez por outra, terminava mais bem-colocada que o carro oficial de fábrica. Isso aconteceu nos 800 km de Dijon, por exemplo.

Em Monza, Larrousse/Jabouille ainda salvaram o 3º lugar, atrás de Arturo Merzario/Jacques Laffite e Reinhold Joest/Mario Casoni. O Alpine A442 não apareceu em Spa e Enna-Pergusa, na Sicília, regressando com um 4º lugar no Nördscheleife de Nürburgring.

No circuito de Zeltweg, a fragilidade do A442 ficou evidenciada após a pole position conquistada por Larrousse e seu novo parceiro Jean-Pierre Jarier. A corrida da dupla não passou de 10 voltas, com problemas na injeção de combustível. O outro carro, de Patrick Depailler e Jody Scheckter, não teve mais sorte e também retirou-se por quebra. Em Glen, na última etapa do ano, Larrousse e Jarier ainda salvaram o pódio com um 3º lugar, mas chegaram atrás das duas Alfas da WKRT.

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Apesar do triunfo inicial, foi uma temporada desastrosa para a Alpine-Renault, que viu a Alfa Romeo fechar o ano com o máximo de pontos permitido – 140 – enquanto a Porsche foi vice-campeã com 98 pontos e os franceses somaram apenas 54. Em 1976, a surra seria pior: sem a Alfa Romeo, a Porsche dominou as ações com o protótipo 936 e sua dupla de então, formada por Jochen Mass/Jacky Ickx.

“Jumper” Jarier e Henri Pescarolo chegaram a dar algum trabalho no início do campeonato: nas 4h de Monza, Trofeo Filippo Caracciolo, ainda terminaram em 2º lugar. Mas o carro tinha seguidos problemas mecânicos que minaram seu desempenho ao longo da temporada, abandonando seguidamente – nos 500 km de Imola e na Coppa Florio Pergusa foi assim. Um novo 2º lugar veio em Dijon através de Jacques Laffite/Patrick Depailler e foi tudo.

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Nas 24h de Le Mans, que não faziam parte de nenhum campeonato na época, o Alpine Renault A442 foi partilhado por Jean-Pierre Jabouille/Patrick Tambay/José Dolhem. Com o numeral #19 pintado na carenagem, o bólido conquistou a pole position com o incrível tempo de 3’33″1 – seis segundos e sete décimos melhor que o Porsche 936 de Jacky Ickx/Gijs Van Lennep. Mas na corrida, a história foi outra: o protótipo alemão venceu com onze voltas de vantagem para o 2º colocado e os franceses abandonaram após 11h e 135 voltas, devido a uma quebra de pistão.

Apesar dos dissabores com os protótipos, a Renault continuava a investir no Alpine A442, agora para ganhar o créme de la créme da Endurance: as 24h de Le Mans. A marca ganhara a Fórmula 2 europeia enfileirando quatro pilotos do país nas quatro primeiras posições e o cerne das competições mudava para a Fórmula 1, onde a Régie pretendia ser a pioneira no uso de motores turbocomprimidos. Em 1977, o ataque foi total, com três carros.

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O #9 com Jean-Pierre Jabouille e Derek Bell fez a pole position, abrindo o grid onde o #8 com Jacques Laffite/Patrick Depailler foi segundo e o #7 de Patrick Tambay/Jean-Pierre Jaussaud largou em quarto. E os três, mais uma vez, ficaram pelo caminho – todos por quebra de motor. Jaussaud/Tambay “caíram” na 14ª hora; Jabouille/Bell desistiram na décima-nona hora e o outro carro de Laffite/Depailler entrou pelo cano na 22ª. Mais uma vez, a Porsche ganhou.

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O “vai ou racha” foi em 1978. Naquele ano, a Alpine-Renault iria fazer sua última aparição em Sarthe. Era aquela, ou nunca mais. E o carro foi preparado como nunca: o motor V6 turbo ganhou mais potência e até a aerodinâmica foi evoluída, com o uso de um parabrisa em plexiglass, melhorando a velocidade de ponta em cerca de 8 km/h no retão Les Hunaudières. O único carro que não teve essa novidade foi o A443, que tinha motor com 520 HP e 2,1 litros de capacidade cúbica, especialmente construído para a dupla Jean-Pierre Jabouille/Patrick Depailler, em quem os franceses depositavam as maiores esperanças.

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Entretanto, esse carro quebrou na vigésima hora, abrindo o caminho para que o #2 guiado por Didier Pironi, jovem promessa de 26 anos e o experiente Jean-Pierre Jaussaud, de 41, dessem à Renault a tão sonhada vitória em Sarthe. O carro completou 370 voltas, cinco a mais que “Brilliant” Bob Wollek/Jürgen Barth/Jacky Ickx, que chegaram em segundo num Porsche 936. Um carro não-oficial guiado por Guy Fréquelin/Jean Ragnotti/José Dolhem chegou em quarto. Aliás e por curiosidade, Dolhem era meio-irmão de Didier Pironi.

A vitória do Alpine-Renault nas 24 Horas de Le Mans em 1978 foi, curiosamente, a segunda e última deste protótipo em provas de grande vulto. Mas não é impossível dizer que os carros pintados primeiro em azul e depois em amarelo estão, de fato, na galeria dos grandes Esporte-Protótipos de todos os tempos.

Esporte-Protótipos Inesquecíveis – Lancia LC1 Spyder (1982)

1982-lancia-lc1-group-6RIO DE JANEIRO – Vamos dar início aqui no blog a uma nova série para lembrar de carros históricos – agora entre os Esporte-Protótipos. O primeiro é este exemplar da foto: o Lancia LC1 Spyder, que disputou o Mundial de Endurance (World Sportscar Championship) em 1982.

Com as cores da Martini & Rossi e dos cigarros MS, este protótipo fez estardalhaço ao competir contra os Porsche 956 nas corridas longas. Originalmente um Grupo 6, este Lancia LC1 foi concebido pela Dallara e construído para receber um motor 4 cilindros em linha com 1.425cc turbocomprimido, ‘calçado’ com pneus Pirelli.

O LC1 era muito veloz, mas tinha problemas de confiabilidade. Logo nos 1000 km de Monza (Trofeo Filippo Caracciolo), primeira corrida do Mundial, fez a pole com Riccardo Patrese/Michele Alboreto, mas tanto este carro quanto o de Piercarlo Ghinzani/Teo Fabi acabaram pelo caminho. Nas 6 Horas de Silverstone (Pace Petroleum), Alboreto/Patrese venceram com três voltas de vantagem para o segundo colocado.

A terceira etapa foi os 1000 km de Nürburgring (Troféu Rudi Caracciola), ainda no velho Nordscheleife. E o protótipo italiano venceu, mais uma vez com Michele Alboreto e Riccardo Patrese, que tiveram a companhia de Teo Fabi. Em Le Mans, com Hans Heyer e Rolf Stommelen reforçando a esquadra italiana de pilotos, nada pôde ser feito para derrotar a Porsche, que venceu com sobras: os dois Lancia quebraram.

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Em Spa-Francorchamps, na 5ª corrida do campeonato (Troféu Diners Club), Teo Fabi passou a dividir o carro #50 com Riccardo Patrese e Michele Alboreto foi para o #51 com Pier Carlo Ghinzani. A pista belga já tinha sofrido uma redução de traçado de 14,1 km para 6,94 km e os Lancia LC1 até que foram bem: chegaram em 3º e quarto, respectivamente. Alboreto/Ghinzani conquistariam a terceira vitória em seis etapas nos 1000 km de Mugello (Trofeo Banca Toscana), na segunda corrida “caseira” do fabricante em 1982.

Nos 1000 km de Fuji, Patrese/Fabi chegaram em 2º lugar, enquanto Alboreto/Ghinzani, que partiram da pole position, abandonaram por batida. Na última corrida do campeonato de 1982, os Shell Oils 1000 km de Brands Hatch, novo segundo posto para Fabi/Patrese e mais um abandono, desta vez por falha mecânica, para Alboreto/Ghinzani.

Como o Lancia LC1 era um Grupo 6, a marca não pôde pontuar no Mundial de Marcas que, teoricamente, tinha mais peso que o certame paralelo de pilotos. A Porsche, com seu modelo 956, levou o título entre os construtores com 75 pontos somados nas cinco provas que contaram para o Mundial de Marcas, contra 70 da Ford-Rondeau e 24 da Aston Martin Nimrod.

Já entre os pilotos, quase deu para Riccardo Patrese: com 87 pontos, ele foi vice-campeão mundial do World Sportscar Championship em 1982. O campeão foi Jacky Ickx, com 95. Teo Fabi somou apenas três pontos a mais que Michele Alboreto (66 a 63) e acabou o campeonato em 4º lugar. Pier Carlo Ghinzani foi o 15º, com 21 pontos somados.

Direto do túnel do tempo (117)

560793_185189278326639_1086931264_nRIO DE JANEIRO – Reta oposta de Monza antes da tomada da Curva Parabólica, para os 1000 km disputados em 1970 como quarta etapa do World Sportscar Championship, Trofeo Filippo Caracciolo. Grid com 38 carros, entre eles o Porsche #10, bem em primeiro plano, guiado por Vic Elford/Kurt Ahrens Jr. para o Team Salzburg; a Ferrari 512 S #3 de Ignazio Giunti/Nino Vaccarella/Chris Amon; o Gulf Porsche #7 da equipe de John Wyer para Pedro Rodriguez/Leo Kinnunen; outra Ferrari, a #2 de  Peter Schetty/John Surtees; o Porsche #9 de Hans Herrmann/Dick Attwood, o #14 de Jürgen Neuhaus/Helmut Kelleners e aí vai.

A vitória foi de Rodriguez/Kinnunen, aliás e a propósito. Média espetacular de 232,649 km/h – num tempo em que Monza não tinha chicanes.

Há 43 anos, direto do túnel do tempo.

 

 

Pequenas maravilhas – Busão da Ligier (1975)

RIO DE JANEIRO – O xará Rodrigo Peixoto não se cansa de colaborar com suas miniaturas para a seção Pequenas maravilhas aqui no blog. Inspirado na foto do busão da Ligier que postei há alguns dias, eis a foto de um outro busão do time francês, usado em 1975 – um ano antes da passagem de Guy Ligier e seus comandados para a Fórmula 1.

Naquele ano, a Ligier disputou o World Sportscar Championship (WSC), ancestral direto do FIA World Endurance Championship (WEC). O modelo da época era o JS2, um carro-esporte montado com motor Ford Cosworth V8 3 litros – igualzinho ao padrão da Fórmula 1 naqueles tempos. No ano seguinte, o JS5, primeiro monoposto construído pela equipe sediada em Vichy, estava com motor Matra V12. Fica o registro.

A miniatura abaixo foi produzida pela Spark, em escala 1/43. E o busão era lindo! Valeu, Peixoto, mais uma vez!

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